Estados Unidos — A Food and Drug Administration (FDA) dos EUA lançou recentemente o projeto Optimus, que visa reformular drasticamente o desenvolvimento de tratamentos oncológicos em estudos clínicos, dando um enfoque especial aos medicamentos experimentais utilizados na abordagem de neoplasias hematológicas.
O objetivo é “identificar e caracterizar melhor as doses ideais” nos estágios iniciais de pesquisa e abandonar a conduta convencional baseada no uso de dose máxima tolerada, disse o onco-hematologista Dr. Marc R. Theoret, vice-diretor do Oncology Center of Excellence da FDA, em uma apresentação na reunião anual da Society for Immunotherapy of Cancer (SITC 2023).
No início deste ano, a FDA divulgou orientações iniciais sobre as mudanças esperadas. A agência defendeu a realização de estudos randomizados e paralelos de dose-resposta sempre que possível, e afirmou que “devem ser fornecidas justificativas sólidas para a escolha da dose antes de iniciar um estudo para registro [de medicamento] a fim de respaldar indicações e usos subsequentes”.
O objetivo de controlar a toxicidade é “muito importante” na pesquisa em hematologia, uma vez que os quimioterápicos usados contra neoplasias hematológicas podem causar efeitos adversos sistêmicos significativos, como problemas respiratórios e cardíacos, disse a médica patologista clínica Dra. Cecilia Yeung, que liderou a sessão da SITC sobre o projeto Optimus e trabalha com estudos experimentais no Fred Hutchinson Cancer Research Center, nos EUA.
Em uma entrevista, a Dra. Cecilia, especializada em hematopatologia, explicou por que os fundamentos da pesquisa oncológica estão mudando e o que os onco-hematologistas podem esperar nos próximos anos.
O projeto Optimus busca ir além da abordagem tradicional de escalonamento de dose para o desenvolvimento de medicamentos oncológicos. Como funciona essa estratégia?
Dra. Cecilia: Antes do projeto Optimus, os pesquisadores usavam uma estratégia chamada "3+3" nos estudos de fase 1, ou seja, davam uma dose a três pacientes relativamente saudáveis e depois aumentavam essas doses em mais pacientes. Eles continuavam aumentando até que dois terços dos participantes que haviam recebido uma dose específica apresentassem efeitos colaterais graves, e então retornavam para a dose imediatamente anterior.
Essa abordagem, que visa identificar a ‘dose máxima tolerada’, parece ter funcionado bem ao longo de décadas de pesquisas sobre medicamentos quimioterápicos. Entretanto, algumas preocupações apareceram à medida que surgiram tratamentos direcionados em certas especialidades oncológicas, como nas neoplasias hematológicas. Por que as coisas mudaram?
Dra. Cecilia: Com o modelo "3+3", era possível determinar rapidamente a toxicidade da quimioterapia. Porém, no tratamento direcionado, descobrimos que esses estudos não são representativos da toxicidade real. Em estudos de fase 1, os pacientes não são tratados por muito tempo, enquanto os que recebem tratamento direcionado podem acabar usando esses medicamentos durante anos. As preocupações começaram, de fato, com os primeiros medicamentos direcionados para o tratamento de leucemias e linfomas. Pesquisas demonstraram que eles tinham uma toxicidade inesperada. Um estudo de 2016 descobriu que, devido à toxicidade, fabricantes de medicamentos tiveram de reduzir a dose original usada na fase 1 em 45% dos estudos de fase 3 [sobre agentes direcionados a pequenas moléculas e anticorpos monoclonais] aprovados pela FDA ao longo de 12 anos.
Qual o objetivo da FDA para o projeto Optimus?
Dra. Cecilia: É ter uma segunda alternativa para equilibrar a [estratégia de] dose máxima tolerada com uma dose segura e tolerável para a maioria dos pacientes.
Que tipo de resistência as empresas farmacêuticas têm oferecido à FDA?
Dra. Cecilia: A FDA traz um bom argumento quando diz que o sistema atual não estava funcionando. Entretanto, as farmacêuticas afirmam que isso aumentará o custo dos estudos, o que impedirá que os pacientes sejam tratados com as doses máximas possíveis. Vejo argumentos [válidos] de ambos os lados e acho que deve haver um equilíbrio entre os dois.
Como essa mudança afetará o desenvolvimento de fármacos?
Dra. Cecilia: Os medicamentos podem ficar mais caros, porque será necessário fazer muito mais testes durante os estudos clínicos.
Isso poderia reduzir o número de medicamentos experimentais em desenvolvimento?
Dra. Cecilia: Esperamos que não, mas isso seria um grande desafio para empresas menores que precisam de financiamento.
Quais as suas perspectivas para o futuro?
Dra. Cecilia: No fim das contas, isso é uma boa mudança, pois, se tudo der certo, teremos menos efeitos colaterais derivados da toxicidade. Porém, teremos que passar por um difícil período de adaptação.
Este conteúdo foi originalmente publicado no MDedge.com ─ Medscape Professional Network
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Citar este artigo: Projeto Optimus: transformando a pesquisa inicial na oncologia - Medscape - 21 de novembro de 2023.
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