Como prescrever atividade física em cinco passos

Lou Schuler

14 de novembro de 2023

Os médicos conhecem bem os benefícios da atividade física e as consequências do sedentarismo. 

Cabe aos médicos controlar as doenças associadas ao sedentarismo — doença cardíaca, diabetes tipo 2 e hipertensão arterial sistêmica. Portanto, pode-se presumir que sempre prescrevam exercícios para os seus pacientes, assim como estatinas, insulina ou betabloqueadores.

Mas as evidências indicam que os médicos não costumam conversar sobre esse assunto com os pacientes. Podem não ter confiança na sua capacidade de dar orientações eficazes, ter medo de ofender os pacientes ou simplesmente não saber o que dizer.

É compreensível. Muitos médicos são pouco instruídos a orientar os pacientes a se exercitar, de acordo com pesquisas feitas nesta última década. Apesar dos esforços para melhorar essa situação, muitos estudantes de medicina ainda se sentem despreparados para prescrever atividade física para seus pacientes.

Mas eis a realidade: os médicos estão numa posição privilegiada para mudar as coisas.

Apenas 28% dos americanos cumprem as diretrizes de atividade física, de acordo com os Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos EUA. Ao mesmo tempo, outras pesquisas sugerem que os pacientes querem ser mais ativos e gostariam de ter a ajuda do seu médico.

"Os pacientes são motivados a ouvir os médicos falarem sobre atividade física e a tentar fazer mudanças", disse a médica Dra. Jane Thornton, Ph.D., professora assistente de medicina da família na Western University no Canadá. "Só dizer algo, mesmo que não tenha conhecimento especializado, faz a diferença por causa da credibilidade que temos como médicos."

Convenientemente, tal como o exercício, a melhor forma de começar é... começando.

Veja a seguir como dividir o processo em etapas.

1. Pergunte aos pacientes sobre a prática de atividade física

Pensem nisto como obter qualquer tipo de informação dos pacientes na anamnese, apenas sobre a atividade física.

Eles têm alguma rotina regular de atividades físicas? Por quantos minutos por dia estão ativos? Quantos dias por semana?

"Leva menos de um minuto para perguntar e registrar", disse a Dra. Jane. Depois de colocar no prontuário eletrônico do paciente, você tem algo que pode acompanhar.

2. Prescreva

Ao dar ao paciente uma prescrição por escrito e impressa quando ele sai do seu consultório, "você está mostrando que é uma parte importante do tratamento ou da prevenção", explicou a Dra. Jane. Coloca a atividade física no nível de um sinal vital.

Inclua frequência, intensidade, tempo e tipo de exercício. A iniciativa Exercise is Medicine do American College of Sports Medicine fornece um modelo de prescrição que você pode usar.

3. Quantifique

A quantificação ajuda o paciente a adotar o novo comportamento, e ajuda o médico a fazer uma orientação personalizada no futuro, disse a Dra. Jane.

Com o aumento dos dispositivos vestíveis de monitorização da saúde, o acompanhamento da atividade nunca foi tão fácil. Claro, nem todos querem (ou podem se dar ao luxo de) usar um smartwatch ou rastreador de condicionamento físico.

Para os pacientes avessos à tecnologia, pergunte se estão dispostos a escrever algo, como quantos minutos caminharam, ou quantas sessões de ioga fizeram. Talvez você nunca obtenha essa informação de alguns pacientes, mas perguntar não dói.

4. Encaminhe quando necessário

Esse passo nos remete a uma questão difícil para muitos médicos: a falta de confiança na sua capacidade de falar com autoridade sobre a atividade física. "Na maioria dos casos, você pode certamente dizer: 'comece devagar, vá gradualmente', esse tipo de coisa", disse a Dra. Jane. "Como acontece com qualquer coisa, a confiança virá com a prática."

Para orientação específica de como prescrever, consulte o site do Exercise is Medicine , que também tem folhetos que você pode compartilhar com os pacientes e informações sobre doenças específicas. Se o seu paciente tiver pré-diabetes, também pode encaminhá-lo para o programa de prevenção do diabetes dos CDC, que está disponível presencialmente ou on-line e pode ser gratuito ou coberto por um plano de saúde.

Se um paciente tiver alguma contraindicação, peça um parecer. Se não houver profissionais de exercício ou reabilitação na sua rede de contatos, a Dra. Jane recomenda contactar sua associação regional ou nacional de profissionais de medicina desportiva. Com uma rápida pesquisa no Google é possível encontrar esse tipo de associação. 

5. Acompanhe

Pergunte sobre a atividade física em todos os contatos, presenciais ou on-line

A Dra. Jane diz que o segundo e o quinto passos são mais importantes para os pacientes, especialmente quando a prescrição e o acompanhamento são feitos pelo médico do atendimento primário, em vez de um enfermeiro ou assistente a quem o médico delegou a tarefa.

"O valor está no fato de um médico enfatizar a importância", disse a Dra. Jane. Quanto mais tempo você gastar fazendo isso, mais vai transmitir esse valor.

O que NÃO dizer aos pacientes sobre a prática de atividade física

Isto pode surpreender: 

"Eu definitivamente não acho que passar às pessoas as recomendações oficiais para a atividade física seja útil", disse o médico Dr. Yoni Freedhoff, professor associado de medicina da família e da comunidade na University of Ottawa e diretor médico do Bariatric Medical Institute. "Se tivesse de dizer alguma coisa, eu arriscaria dizer que seria contraproducente."

Não que haja nada de errado com o mínimo recomendado — 150 minutos de atividade física de intensidade moderada a vigorosa por semana. O problema é o que dizer a um paciente que não se aproxima desses padrões. 

"Poucas pessoas na vida real têm o interesse, o tempo, a energia ou o privilégio de alcançá-los", disse o Dr. Yoni. "Muitos reconhecerão isso instantaneamente e consequentemente sentirão o quanto essa recomendação é inútil."

E isso, disse a Dra. Jane, categoricamente não é verdade. "Mesmo o mínimo de atividade física, em alguns casos, é benéfico."

"O valor está no fato de um médico enfatizar a importância do exercício", disse a Dra. Jane. Quanto mais tempo você gastar fazendo isso, mais vai transmitir esse valor.

Também queremos evitar qualquer ligação explícita entre o exercício e a perda ponderal, disse a Dra. Jane.

Apesar de muitas pessoas fazerem essa associação, ela muitas vezes é negativa, trazendo à tona memórias dolorosas que podem remontar às aulas de ginástica na escola, indicou um estudo de 2019 da University of Toronto

Experimente esta alternativa do Dr. Yoni: "Concentre-se no papel do exercício na diminuição dos riscos do peso", como diminuição da dor, aumento da energia e melhora do sono.

Como motivar os pacientes a se movimentar

Novas pesquisas corroboram essa abordagem mais positiva. Em um estudo publicado em 06 de novembro no periódico Annals of Internal Medicine, os médicos no Reino Unido que enfatizaram os benefícios e minimizaram os danos à saúde convenceram mais pacientes a aderir a um programa de controle de peso do que os médicos que foram negativos ou neutros. Esses médicos transmitiram otimismo e entusiasmo, sorriram e evitaram qualquer menção à obesidade ou ao índice de massa corporal.

Os benefícios que inspiram a mudança serão diferentes para cada paciente. Mas, em geral, quanto mais imediato for o benefício, mais motivador será. 

Como observou o estudo da University of Toronto, os pacientes não foram motivados por objetivos vagos e distantes, como "aumentar a expectativa de vida ou evitar problemas de saúde daqui a muitos anos".

É muito mais provável que tomem medidas para evitar cirurgias, reduzir medicamentos ou minimizar o risco de queda. 

Para um paciente mais velho, o Dr. Yoni orienta: "concentrar-se na preservação da independência funcional pode ser extremamente motivador". Isso é ainda mais verdadeiro se o paciente tiver lembranças vívidas de ter visto um ente querido sedentário declinar no final da vida. 

Já os pacientes mais focados na aparência poderiam reagir melhor à ideia de melhorar a forma física. Para isso, "falamos sobre a qualidade da perda ponderal", disse o médico osteopata Dr. Spencer Nadolsky, especialista em obesidade e lipídios e diretor clínico do WeightWatchers (Vigilantes do Peso). "Em última análise, o exercício ajuda a modelar o corpo em vez de apenas mudar o número na balança."

Reduzindo a resistência ao treino de resistência

Uma conversa sobre remodelar o corpo ou evitar incapacidades relacionadas com a idade leva naturalmente ao treino de resistência.

"Eu sempre classifico o treino de resistência como a coisa mais valiosa que uma pessoa pode fazer para tentar preservar sua independência funcional", disse o Dr. Yoni. Se o paciente tiver mais de 65 anos, o médico não espera ele que mostre interesse. "Com certeza, vou tocar nesse assunto com ele."

O Dr. Yoni tem uma sala de treino no consultório onde preparadores físicos mostram aos pacientes como se exercitar em casa com o mínimo de equipamento, como halteres e faixas elásticas de resistência. 

A maioria dos médicos, no entanto, não tem essas opções. Isso pode levar a uma conversa complicada. Os participantes do estudo da University of Toronto disseram aos autores que não gostavam de academias, achando o local "chato, intimidante ou desencorajador". 

E, no entanto, "uma sugestão comum... dos profissionais de saúde era frequentar uma academia".

Muitos pacientes, disse o Dr. Spencer, associam a musculação a "grunhidos, gemidos ou a ficar ‘bombados’ em vez de ‘tonificados’.” Lembranças de dor causada por exercícios extremamente intensos são outra barreira.

O médico recomenda "começar com pouco e devagar", com um ou dois treinos de corpo inteiro por semana. Esses treinos iniciais podem incluir apenas uma a duas séries de quatro a cinco exercícios. "Considere se o paciente está se exercitando em casa ou numa academia para montar uma rotina que leve em conta os equipamentos que estão disponíveis", disse o Dr. Spencer.

Depois de determinar quais são os recursos disponíveis, ajude o paciente a escolher exercícios que se ajustem às suas necessidades, objetivos, preferências, limitações e lesões anteriores.

Mais uma consideração: embora tente "evitar dizer a um paciente que ele precisa fazer tipos específicos de exercícios para ter sucesso", o Dr. Spencer abre uma exceção para os pacientes que estão tomando um agonista do peptídio 1 glucagonoide. "Existe uma preocupação com a perda de massa muscular junto com a perda de gordura."

Praticar, pregar e checar privilégios

Quando a Dra. Jane, o Dr. Yoni e o Dr. Spencer falam sobre exercícios, os seus pacientes sabem que eles praticam o que pregam. 

O Dr. Spencer, que um foi lutador de wrestling da University of North Carolina reconhecido nos Estados Unidos, tem o podcast Docs Who Lift com seu irmão, o médico Dr. Karl Nadolsky. 

O Dr. Yoni também é um entusiasta do halterofilismo e de cultivar uma boa forma física. 

E a Dra. Jane era uma remadora de classe mundial cuja equipe ficou a 0,8 s de uma medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Pequim. (Sua equipe terminou em quarto lugar.)

Mas nem todos os médicos seguem o seu próprio conselho de estilo de vida, disse o Dr. Yoni. Isso não os torna maus médicos — os torna humanos.

"Fiz 300 minutos por semana de exercício" — a quantidade recomendada para a manutenção do peso — "para ver o que isso representa", disse o Dr. Yoni. "Isso está bem longe, muito longe, longe mesmo de ser uma quantidade trivial." 

Essa constatação leva a este conselho para os seus colegas médicos:

"A coisa mais importante a saber sobre o exercício é que encontrar tempo e ter saúde para fazer é um privilégio", disse o Dr. Yoni. 

Compreender isso é crucial para avaliar as necessidades do seu paciente e prover a ajuda certa.

Este conteúdo foi originalmente publicado no Medscape

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