Aprendizado de máquina na avaliação da doença de Parkinson: um recurso promissor

Liam Davenport

19 de setembro de 2023

Dinamarca — Se validadas em pesquisas futuras, tecnologias baseadas em aprendizado de máquina (machine learning) poderão, em breve, ser utilizadas no diagnóstico diferencial de síndromes parkinsonianas e na predição de disfunções da marcha em pacientes com doença de Parkinson, apontam dois estudos inéditos.

No primeiro estudo, três modelos baseados em aprendizado de máquina analisaram imagens de tomografia por emissão de pósitrons (PET) com fluorodesoxiglicose (FDG) de mais de 260 pacientes com síndromes parkinsonianas provenientes de centros na Eslovênia e nos Estados Unidos.

Todos os modelos diagnosticaram diferencialmente os pacientes com doença de Parkinson, atrofia multissistêmica (AMS) ou paralisia supranuclear progressiva (PSP) com uma acurácia de aproximadamente 90%, segundo o apresentador do estudo, Dr. Matej Perovnik, Ph.D., médico vinculado ao Departamento de Neurologia do Centro Médico Universitário de Ljubljana, Eslovênia.

"Embora não seja perfeito, o desempenho diagnóstico é bastante animador e se equipara ao de muitas outras ferramentas diagnósticas que utilizam biomarcadores ou exames de imagem", disse em um comunicado à imprensa o Dr. Ronald B. Postuma, neurologista afiliado ao McGill University Health Centre Research, Canadá, que não participou da pesquisa.

No segundo estudo, uma equipe da Thomas Jefferson University, EUA, mostra que um modelo de aprendizado de máquina baseado em uma combinação de exames de neuroimagem e características clínicas de mais de 40 pacientes com doença de Parkinson conseguiu identificar disfunções da marcha com uma acurácia de quase 80%.

“Esse achado respalda o uso de métodos de aprendizado de máquina na predição de disfunções da marcha na doença de Parkinson” por meio de exames de neuroimagem baseados em regiões de interesse, segundo o abstract do estudo.

As duas pesquisas foram apresentadas no International Congress of Parkinson's Disease and Movement Disorders (MDS) 2023, realizado na Dinamarca.

Diferenciando síndromes parkinsonianas 

Os exames de neuroimagem baseados em PET-FDG e a análise neural podem ser usados para identificar padrões cerebrais metabólicos específicos relacionados a patologias associadas à doença de Parkinson, à paralisia supranuclear progressiva e à atrofia multissistêmica, disse o Dr. Matej.

Ao quantificar a expressão desses padrões em um determinado paciente, é possível obter um escore individual que pode ser utilizado no diagnóstico diferencial e no rastreamento da progressão da doença, disse ele.

Para automatizar esse processo, os pesquisadores buscaram desenvolver um algoritmo de diagnóstico diferencial que combinasse os recursos da PET-FDG com o aprendizado de máquina para diferenciar as síndromes parkinsonianas.

Eles coletaram informações sobre padrões patológicos específicos em duas populações de pacientes com sintomas de Parkinson, uma da Eslovênia e outra dos EUA. Os diagnósticos clínicos definitivos dos pacientes eram desconhecidos no momento da realização dos exames de imagem.

Em seguida, a equipe de pesquisadores definiu três conjuntos de dados para serem analisados pelos modelos de aprendizado de máquina: um baseado em características clínicas previamente validadas na população eslovena, outro derivado de padrões de características análogas na população dos EUA e um terceiro obtido por meio de uma máquina de vetores de suporte baseada em 95 regiões cerebrais de interesse.

No estudo foram analisados 265 exames de FDG-PET de indivíduos dos dois países. Entre eles, havia 161 pacientes com Parkinson, 57 com atrofia multissistêmica e 47 com paralisia supranuclear progressiva.

A acurácia global dos três modelos foi semelhante: 86% para o modelo baseado nos dados da Eslovênia, 85% para o modelo baseado na população dos EUA e 89% para o modelo baseado nas regiões de interesse.

Segundo o Dr. Matej, isso mostra que “as redes cerebrais metabólicas identificadas em uma instituição podem ser usadas em outros locais”. A visualização do modelo baseado nas regiões de interesse demonstrou que “topografias metabólicas semelhantes podem ser identificadas usando metodologias diferentes”.

“Ficou bastante evidente que existem diferenças reprodutíveis entre as síndromes parkinsonianas com relação aos padrões globais visualizados na PET-FDG”, comentou o Dr. Ronald, “e essas mudanças podem ser observadas muito precocemente no processo [de evolução] de cada doença”.

Uma das dificuldades, disse ele, é que muitas vezes os padrões se sobrepõem parcialmente. Isso sugere que as ferramentas de aprendizado de máquina “podem ser muito úteis, pois elas não precisam necessariamente pré-determinar um padrão específico”.

Predição de disfunções da marcha 

Normalmente, a função da marcha é “avaliada a olho nu”, explicou o coautor do segundo estudo, Dr. Tsao-Wei Liang, que é diretor médico no Jefferson Comprehensive Parkinson's Disease and Movement Disorders Center da Thomas Jefferson University, nos EUA.

Além disso, essa avaliação ocorre no consultório, “que geralmente é um ambiente clínico muito heterogêneo, sem um padrão determinado a ser seguido”, disse ele ao Medscape.

Consequentemente, os resultados são altamente variáveis, “pois cada médico pode ter um ponto de vista um pouco diferente [durante a avaliação] no consultório”.

Embora escalas de classificação possam complementar a análise da marcha, elas fornecem “um escore de apenas um dígito", explicou o Dr. Tsao-Wei, “e infelizmente não descrevem adequadamente todos os detalhes”.

Com base nesse entendimento, a equipe de pesquisadores decidiu “analisar a disfunção da marcha de forma mais aprofundada”, comparando o desempenho de oito modelos de aprendizado de máquina na predição de disfunções da marcha em 43 pacientes submetidos à ressonância magnética com tensor de difusão.

Inicialmente, as imagens foram avaliadas através de diferentes técnicas e geraram sete mapas cerebrais. Os resultados foram combinados com dados relacionados a idade, sexo e escores na terceira edição da MDS Unified Parkinson's Disease Rating Scale e, em seguida, inseridos nos modelos de aprendizado de máquina.

Em comparação com avaliações padronizadas em consultório, um modelo perceptron com cinco camadas ocultas e ativação linear retificada teve o melhor desempenho na classificação binária da presença de disfunções da marcha versus ausência de disfunções da marcha, com uma acurácia de 77,8%.

"O estudo sugere que, se confirmada em estudos maiores específicos, uma abordagem baseada em aprendizado de máquina para a análise de imagens de [ressonância magnética com] tensor de difusão pode ter um potencial na predição de disfunções da marcha em pacientes com doença de Parkinson", comentou o Dr. Klaus Seppi, médico e professor de neurologia na Medizinische Universität Innsbruck, na Áustria, em um comunicado de imprensa.

Estudos futuros devem “analisar se esse padrão muda conforme a progressão da doença”, ele acrescentou.

Não foi informado nenhum tipo de financiamento para a pesquisa. Os autores dos estudos informaram não ter conflitos de interesses relevantes ao tema.

International Congress of Parkinson's Disease and Movement Disorders (MDS) 2023: Abstracts 297 e 1.599. Apresentado em 28 de agosto.

Este conteúdo foi originalmente publicado no Medscape

Siga o Medscape em português no Facebook, no X (antigo Twitter) e no YouTube

Comente

3090D553-9492-4563-8681-AD288FA52ACE
Comentários são moderados. Veja os nossos Termos de Uso

processing....