A infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH) ainda é um dos maiores desafios globais de saúde, acometendo milhões de pessoas em todo o mundo. Apesar dos avanços notáveis nas opções de tratamento, uma vacina eficaz é urgentemente necessária para prevenir novas infecções e conter a pandemia de VIH. Nos últimos anos, várias abordagens promissoras surgiram na pesquisa de imunizantes contra o vírus, visando diferentes plataformas vacinais e empregando estratégias inovadoras.
Neste artigo, abordarei as diferentes plataformas e alvos de vacinas; os resultados de ensaios clínicos recentes, como os estudos Mosaico e Imbokodo; a produção de anticorpos amplamente neutralizantes (bNAbs) e seus resultados nos estudos de fase 1; e o potencial da plataforma de ácido ribonucleico mensageiro (ARNm) com base na experiência com a vacina contra a covid-19.
Plataformas e alvos
Na busca por uma vacina eficaz contra o VIH, pesquisadores exploraram diversas plataformas e alvos para estimular uma resposta imune robusta. Essas plataformas incluem vetores virais, subunidades proteicas, ácido desoxirribonucleico (ADN) e ARNm. Cada opção tem vantagens e desafios únicos, mas todas têm o objetivo final de estimular o sistema imunológico a reconhecer e neutralizar o VIH. O mecanismo que leva a essa resposta ocorre de diversas formas conforme a plataforma viral utilizada:
Vacinas com vetores virais, como adenovírus e vírus da estomatite vesicular, que podem ser modificados geneticamente, levam antígenos específicos do VIH às células do hospedeiro, desencadeando uma resposta imune;
Vacinas de subunidades proteicas focam na apresentação de proteínas virais específicas ao sistema imunológico;
Vacinas de ADN introduzem ADN do vírus geneticamente modificado nas células, levando à produção de proteínas virais e estimulando uma resposta do sistema imunológico;
Vacinas de ARNm aproveitam a maquinaria celular do organismo para produzir antígenos virais e induzir uma resposta imune robusta.
A falha no estágio final da criação da vacina da Janssen no início de 2023 expõe a escassez do pipeline para abordagens profiláticas no VIH, apesar de anos de tentativas.
O estudo Imbokodo avaliou o esquema vacinal contra o VIH com base no vetor adenoviral mosaico em mulheres da África Austral. [1]Da mesma forma, o estudo Mosaico, realizado com uma população diversa de homens que fazem sexo com homens (HSH) e indivíduos transgêneros, avaliou a eficácia de um esquema vacinal com base no vetor adenoviral e na abordagem de subunidades proteicas. [2] Em 2023, o estudo Mosaico foi suspenso por não atingir a eficácia desejada. [3]O fracasso desses testes significa que atualmente não há vacinas contra o VIH na última fase de avaliação ou perto da etapa de licenciamento.
Novas tecnologias e abordagens não tradicionais são extremamente necessárias. As utilizadas no passado geralmente focam características de epítopos proteicos pré-definidos, entretanto, alguns vírus como o Influenza, SARS-CoV-2 e VIH podem apresentar grande diversidade antigênica e um importante escape de resposta imune, o que inviabiliza essas estratégias.
Indução da produção de bNAbs: uma estratégia promissora
A vacina contra o VIH provavelmente precisará induzir a produção de bNAbs, que são capazes de reconhecer cepas de VIH globalmente diversas e podem prevenir a infecção. Um dos principais desafios é que os bNAbs raramente são produzidos, mesmo durante a infecção. Eles se ligam a epítopos relativamente conservados nas glicoproteínas de membrana de cada patógeno, com características de cada anticorpo permitindo a ligação a um epítopo específico. Se desenvolvessemos vacinas capazes de induzir consistentemente bnAbs semelhantes, de preferência em conjunto com a ampla ação das células T, a proteção contra esses patógenos poderia ser alcançada.
Recentemente, no final de 2022, os dados de um primeiro estudo de fase 1 com 48 indivíduos trouxeram esperança no avanço de novas abordagens para as vacinas contra o VIH. [4]O imunizante em desenvolvimento teve como alvo a linhagem germinativa, o que significa que foi projetada para induzir a produção de bNAbs, e seus resultados demonstram que 97% dos participantes atingiram o desfecho final, que era a produção desses anticorpos com boa segurança. Embora desafios como o alto custo de produção e a necessidade de injeções repetidas ainda existam, a produção de bNAbs representa uma via promissora para o desenvolvimento de uma vacina eficaz contra o VIH.
Imunizantes em desenvolvimento
O notável sucesso das vacinas de ARNm contra a covid-19 reacendeu o interesse em aproveitar essa plataforma para o desenvolvimento de imunizantes anti-VIH. Essa plataforma tem várias vantagens, como produção rápida, facilidade de modificação da vacina e capacidade de induzir respostas imunes robustas e duradouras. Atualmente, existem duas vacinas de ARNm da Moderna em elaboração, ambas em fase 1, em 3 estudos diferentes. [5,6,7]A vacina mRNA-1644 da Moderna utiliza o alvo eOD-GT8 60mer e a vacina mRNA-1574, outros alvos novos. Ambas tentam estimular as células germinativas a induzir bNAbs.
Teremos os resultados desses 3 estudos ainda este ano, e eles serão fundamentais para entender o papel da nova plataforma de ARNm na produção de bNAbs e, por fim, garantir proteção contra diferentes linhagens do vírus VIH. Ao aproveitar as lições aprendidas com o desenvolvimento das vacinas anticovídicas, podemos acelerar a criação de imunizantes contra o VIH com elevada produção de bNAbs. Essa abordagem promissora pode trazer novas perspectivas e avanços significativos no combate às infecções por VIH.
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Citar este artigo: Avanços na pesquisa de vacinas contra o VIH: um caminho promissor para a prevenção - Medscape - 17 de mai de 2023.
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