Suplementação de vitamina D em pessoas com obesidade: há prejuízo?

Nancy A. Melville

25 de janeiro de 2023

Nova análise de ensaio clínico randomizado aponta que a resposta à suplementação de vitamina D pode ser menor em pessoas com obesidade.

"Aparentemente, ocorre algo diferente no metabolismo da vitamina D em pessoas com peso corporal mais alto e este estudo pode ajudar a explicar a diminuição dos resultados da suplementação em pessoas com alto índice de massa corporal", disse a primeira autora do estudo, Dra. Deirdre K. Tobias, epidemiologista na Divisão de Medicina Preventiva no Brigham and Women's Hospital nos Estados Unidos, em um comunicado de imprensa divulgado junto com o estudo, publicado on-line em 17 de janeiro no periódico JAMA Network Open.

Os achados são de uma análise post-hoc do ensaio clínico em larga escala Vitamin D and Omega-3 Trial (VITAL), que, sobretudo, não mostrou benefícios em relação aos desfechos primários oncológicos ou aos principais desfechos cardiovasculares para os participantes que foram randomizados para receber cinco anos de suplementação de vitamina D (2.000 UI/dia) em vez de placebo.

No entanto, análises secundárias pré-especificadas de acordo com o peso corporal mostraram que as pessoas com peso normal (índice de massa corporal < 25,0 kg/m2) apresentaram benefícios significativos com a suplementação em termos de incidência de câncer (24% menor), morte por câncer (42% menor) e doença autoimunitária (22% menor). Mas não foram observados benefícios correspondentes entre os participantes com sobrepeso ou obesidade.

A nova análise contextualiza os achados gerais do ensaio clínico, o que é importante, observou a médica Dra. Katherine N. Bachmann no editorial que acompanha o estudo.

"Graças ao grande tamanho da amostra e às análises detalhadas dos biomarcadores, o estudo em tela pode trazer novas evidências de que as respostas à suplementação com vitamina D são atenuadas nas pessoas com sobrepeso e obesidade, o que pode ter contribuído para os desfechos diferenciados pelo índice de massa corporal observados no ensaio clínico VITAL original", escreveu a editorialista.

"Novos estudos são necessários para determinar a dose ideal ou o nível circulante de vitamina D para os pacientes com obesidade em termos de desfechos de saúde sem relação com os ossos", acrescentou a Dra. Katherine, que é afiliada à Divisão de Diabetes, Endocrinologia e Metabolismo do Vanderbilt University Medical Center nos Estados Unidos.

Nova análise examinou a vitamina D e os biomarcadores ao início do estudo e dois anos depois

Para analisar mais de perto as alterações específicas dos níveis séricos de vitamina D e seus biomarcadores entre os diferentes grupos de peso corporal, a Dra. Deirdre e colaboradores avaliaram dados de 16.515 participantes do estudo (dos 25.000 originalmente participantes do ensaio clínico VITAL) e avaliou as mudanças dos principais níveis séricos de vitamina D e biomarcadores no início e no acompanhamento.

De modo alinhado às observações comuns de níveis mais baixos de vitamina D na obesidade, os participantes das categorias de índice de massa corporal mais altas apresentaram níveis médios cada vez mais baixos de 25-hidroxivitamina D (25[OH]D) sérica total antes da randomização, variando de 32,3 ng/mL para as pessoas com peso normal a 28,0 ng/mL para as pessoas com obesidade classe II (P < 0,001 para uma tendência linear).

Os níveis iniciais de outros biomarcadores da vitamina D também foram menores com maior índice de massa corporal, como 25(OH)D3 total, vitamina D livre e vitamina D biodisponível.

Entre os 2.742 participantes com coletas de sangue repetidas no segundo ano, foram observados aumentos médios significativos — em geral, ao término do período de estudo — dos níveis séricos de 25(OH)D (11,9 ng/mL) entre os randomizados para suplementação de vitamina D, em comparação a pouca alteração no grupo do placebo (- 0,7 ng/mL).

No segundo ano, houve também aumentos significativos, no geral, no total dos níveis médios de 25(OH)D, 25(OH)D3, vitamina D livre e vitamina D biodisponível entre os que receberam suplementação, com pouca ou nenhuma alteração no grupo do placebo.

Quando estratificados pelo índice de massa corporal, entretanto, a magnitude do aumento foi menor entre aqueles com maior índice de massa corporal ao início do estudo (todas as interações de efeito do tratamento com P < 0,001). Por exemplo, os aumentos médios do nível total de 25(OH)D em dois anos para a suplementação comparada ao placebo foram de 13,5 ng/mL para os participantes com índice de massa corporal < 25,0 kg/m2 versus apenas 10,0 ng/mL para os participantes com índice de massa corporal ≥ 35,0 kg/m2.

É importante ressaltar que, mesmo após o controle do estado de suficiência ou insuficiência da vitamina D ao início do estudo, o índice de massa corporal ainda foi significativamente associado a alterações observadas com a suplementação.

"Foi surpreendente que, mesmo no contexto de baixos níveis de vitamina D, as pessoas com maior índice de massa corporal ainda tivessem uma resposta menor à suplementação, sugerindo que a interação entre a suplementação e o índice de massa corporal com os desfechos em saúde não se deve simplesmente à maior prevalência de deficiência", disse a Dra. Deirdre ao Medscape.

"Parece realmente que mesmo com níveis iniciais insuficientes ou baixos, os participantes com índice de massa corporal mais alto não conseguem alcançar níveis suficientes, como aqueles com índice de massa corporal normal."

Mecanismos

Uma das principais teorias sobre por que o índice de massa corporal mais alto estaria associado a níveis de vitamina D séricos mais baixos e a uma resposta mais baixa à suplementação é que, como a vitamina D é uma vitamina lipossolúvel, o aumento da adiposidade e da capacidade de armazenamento de gordura com o maior índice de massa corporal resulte em maior remoção da vitamina circulante.

"Nossos resultados estão em grande parte alinhados com essa hipótese", observaram os autores.

Os pesquisadores acrescentaram que os estudos de perda ponderal, como os feitos com cirurgia bariátrica, mostraram maiores aumentos dos níveis séricos de 25(OH)D ou de vitamina D circulante após a perda ponderal em comparação ao início do estudo.

Outras teorias sugerem que a disfunção hepática induzida pela obesidade possa contribuir para o comprometimento do metabolismo da vitamina D.

Sem uma compreensão clara dos mecanismos exatos, o potencial de abordar os níveis mais baixos de vitamina D com, por exemplo, doses mais altas de suplementação para as pessoas com obesidade também permanece incerto, disse a Dra. Deirdre.

"Acredito que quando houver mais clareza sobre qual é o mecanismo, então fará sentido considerar quais doses poderiam ser necessárias para alcançar os níveis internos desejados", disse a pesquisadora.

O estudo VITAL recebeu financiamento de uma bolsa do National Center for Complementary and Integrative Health e de outras fontes. Os conflitos de interesses completos dos autores estão detalhados no estudo publicado.

JAMA Netw Open. Publicado em 17 de janeiro de 2023. Abstract, Editorial

Este conteúdo foi originalmente publicado no Medscape.

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