Não há dúvidas quanto à importância de um bom controle glicêmico ao longo da vida. E, agora, mais evidências reforçam a relevância dessa medida. Um estudo publicado no final de 2022 no periódico Cardiovascular Diabetology [1] mostra que a descompensação glicêmica contribui para a rápida progressão da aterosclerose em pessoas sem sinais de placa coronariana na angiotomografia.
A análise retrospectiva do tipo caso-controle utilizou dados de participantes do estudo PARADIGM, [2] um registro multicêntrico que envolveu países de todo o mundo e que buscou entender fatores associados à progressão (ou regressão) da aterosclerose coronariana. Entre 2003 e 2015, aproximadamente 3.000 pessoas realizaram pelo menos duas angiotomografias para caracterizar e quantificar a presença de placas coronarianas.
Em entrevista ao Medscape, o Dr. Ilan Gottlieb, cardiologista e coordenador do serviço de radiologia na Casa de Saúde São José no Rio de Janeiro, que participou da criação desse registro, explicou que a análise do PARADIGM foi feita em um laboratório central na Coreia do Sul, de forma cega e detalhada.
Os pesquisadores analisaram dados de 402 participantes do PARADIGM sem detecção de placa coronariana na primeira angiotomografia.
Após um acompanhamento médio de 3,6 anos, novos exames identificaram que 35,6% dos pacientes desenvolveram placas coronarianas e 4,2% tiveram progressão rápida de placa, ou seja, apresentaram mudança igual ou superior a 1,0% no volume percentual de ateroma.
Se, por um lado, fatores de risco tradicionais como idade avançada (≥ 60 anos), sexo masculino, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, hiperlipidemia, obesidade e tabagismo no momento inicial do estudo não foram associados à progressão rápida de placa, a situação foi diferente com o controle glicêmico. Os autores observaram que os níveis séricos de hemoglobina glicada (HbA1c) verficados durante o acompanhamento foram independentemente associados com a mudança do volume percentual de ateroma ao longo do ano.
Segundo o Dr. Ilan, o fato de apenas a hemoglobina glicada (e não o diagnóstico de diabetes mellitus) estar associada à progressão rápida de placa indica que o controle da doença é mais relevante do que o diagnóstico para a progressão da aterosclerose.
O médico pontuou que, apesar de o controle da hemoglobina glicada também ser feito com o uso de medicamentos, ele é alcançado principalmente através de mudanças no estilo de vida, como adequação alimentar, prática de atividade física, redução dos níveis de estresse, entre outras. “Dessa forma, a hemoglobina glicada alta pode ser apenas um marcador daqueles pacientes que se cuidam menos e, portanto, esses dados podem transcender o diabetes, mas isso é só uma especulação pessoal dos dados apresentados”, destacou.
A pesquisa mostrou ainda que, com relação à hemoglobina glicada, o ponto de corte de 7,05% foi o que teve melhor sensibilidade e especificidade para o desfecho de progressão de aterosclerose. Mas, de acordo com o pesquisador, esse achado não indica necessariamente que deve ser feito o rastreio nesses pacientes por meio de angiotomografia.
A detecção precoce da aterosclerose assintomática tem se tornado cada vez mais relevante. E, para o Dr. Ilan, entre os achados mais importantes do PARADIGM, está a demonstração de que os maiores fatores de risco para a progressão da aterosclerose são a presença e a quantidade de aterosclerose coronariana. “Ou seja, de forma geral (e mantidas estáveis as outras variáveis), quem já tem mais aterosclerose no momento inicial [da observação] progride mais rápido”, explicou. Isso, segundo o médico, pode ser justificado por algumas hipóteses, por exemplo, a de que a presença de mais aterosclerose ao início do estudo teria ocorrido nos pacientes mais aterogênicos e, por isso, eles progrediram mais rápido. Outra hipótese, segundo ele, é que a presença de aterosclerose levaria ao agravamento da aterosclerose, num ciclo retroalimentável de aceleração de doença. “Independentemente de qual a hipótese correta, o diagnóstico precoce é fundamental para o atendimento adequado desses pacientes”, destacou.
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Citar este artigo: Controle glicêmico é relevante para a progressão da aterosclerose - Medscape - 18 de janeiro de 2023.
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