A memória de curto prazo de adultos jovens pode ser potencializada com a aplicação de uma terapia a laser não invasiva ao córtex pré-frontal direito, sugere pesquisa.
Os pesquisadores compararam o efeito da a fotobiomodulação transcraniana (tPBM, sigla do inglês transcranial photobiomodulation) a laser com comprimento de onda de 1.064 nm aplicada por 12 minutos no córtex pré-frontal direito versus três outros braços de tratamento: (1) tPBM aplicada ao córtex pré-frontal esquerdo; (2) tPBM com um comprimento de onda menor; e (3) intervenção simulada.
Os participantes foram expostos a diversos itens e, depois da intervenção, foram solicitados a lembrar desses itens. O grupo que recebeu a terapia de 1.064 nm no lado direito do córtex pré-frontal apresentou um desempenho até 25% superior nas tarefas de memória em comparação com os outros grupos.
Pacientes com distúrbios relacionados à atenção, como o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), "podem se beneficiar desse tipo de tratamento, que é seguro, simples, não invasivo e sem efeitos colaterais", disse em um comunicado à imprensa o copesquisador Dongwei Li, doutorando no Centre for Human Brain Health da University of Birmingham no Reino Unido.
Os achados foram publicados on-line em 02 de dezembro no periódico Science Advances.
Diferentes comprimentos de onda
Os pesquisadores observaram que "nas últimas décadas" a tecnologia de estimulação cerebral não invasiva por aplicação transcraniana de campos elétricos ou magnéticos diretos ou alternados "provou-se útil" na melhora da memória de trabalho.
Quando aplicada ao córtex pré-frontal direito, a tPBM melhorou a precisão e a velocidade de reação em tarefas que exigem memória de trabalho, além de ter levado a melhorias em "funções cognitivas de alto nível", como atenção sustentada, emoção e funções executivas.
Os pesquisadores pretendiam avaliar o impacto da tPBM aplicada a diferentes partes do cérebro e com diferentes comprimentos de onda. Eles conduziram quatro experimentos duplo-cegos controlados por simulação, abrangendo 90 estudantes universitários neurotípicos (média de idade de 22 anos). Cada aluno participou de apenas um dos quatro experimentos.
Todos os participantes completaram duas sessões de tPBM, separadas por uma semana de intervalo, sendo comparadas as sessões de tPBM simulada e efetiva. Foram aplicados dois tipos diferentes de tarefas de detecção de mudanças: uma exigia que os participantes relembrassem a orientação de uma série de itens antes e depois da intervenção, e outra exigia que se lembrassem da cor desses itens (experimentos 1 e 2, respectivamente).
Uma série de experimentos de acompanhamento se concentraram na comparação de diferentes comprimentos de onda (1.064 nm versus 852 nm) e diferentes pontos de estimulação (córtex pré-frontal direito versus córtex pré-frontal esquerdo), sendo denominados experimentos 3 e 4, respectivamente.
Registros de eletroencefalograma foram obtidos durante a intervenção e as tarefas de memória.
Cada experimento consistiu em uma sessão efetiva de tPBM e uma sessão simulada de tPBM, sendo cada intervenção composta de 12 minutos de aplicação de laser (ou simulação da aplicação). Essas sessões foram realizadas no primeiro e no sétimo dia; no oitavo dia os participantes deveriam relatar (ou adivinhar) qual sessão correspondeu à tPBM efetiva.
Astrócitos estimulantes
Os resultados mostraram que a tPBM de 1.064 nm, em comparação com a intervenção simulada, esteve relacionada a melhora nas pontuações e na capacidade da memória de trabalho nas tarefas de orientação e de cores.
Os participantes que receberam o tratamento direcionado foram capazes de se lembrar de entre quatro e cinco objetos do teste, enquanto os que receberam as variações do tratamento só foram capazes de se lembrar de entre três e quatro objetos.
Tabela. Tarefa de memória de trabalho de orientação versus tarefa de memória de cores
Experimento (tarefa) | Diferença | Valor de P | Efeito médio da tPBM (efetiva menos simulada) |
---|---|---|---|
1 (orientação) | T22 = 2,841 | 0,009 | 0,186 ± 0,065 (BF10 = 5,212; d de Cohen = 0,568) |
2 (cores) | T17 = 2,760 | 0,013 | 0,188 ± 0,051 (BF10 = 20,336; d de Cohen = 0,651) |
"Esses resultados sustentam a hipótese de que a tPBM de 1.064 nm no córtex pré-frontal direito aumenta a capacidade da memória de trabalho", registraram os pesquisadores.
Eles também encontraram melhorias na memória de trabalho dos participantes que receberam tPBM versus a intervenção simulada, independentemente de o desempenho na tarefa de memória de trabalho estar em um nível baixo ou alto. Esse achado foi verdadeiro tanto no experimento de orientação como no de cores.
"Portanto, os participantes com memória de trabalho boa ou ruim melhoraram após a tPBM de 1.064 nm", observaram os pesquisadores.
Além disso, os participantes não conseguiram adivinhar ou relatar se receberam sessões de tPBM simulada ou efetiva.
O monitoramento do eletroencefalograma evidenciou mudanças na atividade cerebral capazes de predizer as melhorias no desempenho da memória. Em particular, a tPBM de 1.064 nm aplicada ao córtex pré-frontal direito aumentou a atividade de atraso contralateral (CDA, sigla do inglês contralateral delay activity) da região parieto-occipital, com a CDA mediando a melhora da memória de trabalho.
Isso é “consistente com pesquisas anteriores em que a atividade de atraso contralateral é um indicativo do número de objetos mantidos na memória de trabalho visual", declararam os pesquisadores.
As análises de correlação de Pearson mostraram que as diferenças nos efeitos do tamanho do conjunto de atividade de atraso contralateral entre as intervenções efetiva e simulada "correlacionaram-se positivamente" com as diferenças comportamentais entre essas intervenções. Para a tarefa de orientação, o r foi de 0,446 (P < 0,04); para a tarefa de cores, foi de 0,563 (P < 0,02).
Não foram encontradas melhorias semelhantes com a tPBM com aplicação de laser em comprimento de onda de 852 nm.
"Precisamos de mais estudos para entender exatamente por que a tPBM está levando a esse efeito positivo", disse no comunicado à imprensa o copesquisador Dr. Ole Jensen, Ph.D., professor de neurociência translacional e codiretor no Centre for Human Brain Health.
“É possível que o laser esteja estimulando os astrócitos — as fábricas de energia — nas células nervosas do córtex pré-frontal, e isso tem um efeito positivo na eficiência das células”, observou ele.
O Dr. Ole acrescentou que sua equipe "também investigará quanto tempo os efeitos podem durar. É claro que, se esses experimentos levarem a uma intervenção clínica, precisaremos ver benefícios duradouros."
Benefícios cognitivos e emocionais
Comentando para o Medscape, o Dr. Francisco Gonzalez-Lima, Ph.D., professor no Departamento de Psicologia da University of Texas em Austin, nos Estados Unidos, considerou o estudo "bem-sucedido".
O Dr. Francisco foi um dos primeiros pesquisadores a demonstrar que a estimulação transcraniana com laser infravermelho de 1.064 nm "produz efeitos cognitivos e emocionais benéficos em humanos, como a melhora da memória de trabalho visual".
Este estudo "relatou um efeito cerebral adicional associado à melhora da memória de trabalho visual, que consiste em uma resposta evidenciada pelo eletroencefalograma, o que é um novo achado", observou o Dr. Francisco, que não participou do estudo.
Ele acrescentou que o mesmo método a laser "foi considerado, pelo seu laboratório, eficaz para melhorar a cognição em idosos e em pacientes com transtornos depressivos e bipolares".
O estudo foi subsidiado pela Fundação Nacional de Ciências Naturais da China, pelo Ministério de Ciência e Tecnologia da China e pelo Programa de Pesquisa Científica Básica como Estratégia de Defesa Nacional da China. Os pesquisadores e o Dr. Francisco Gonzalez-Lima informaram não ter conflitos de interesse relevantes.
Sciences Advances. Publicado on-line em 02 de dezembro de 2022. Artigo completo
Este conteúdo foi originalmente publicado no Medscape .
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Imagem principal: Dreamstime
Medscape Notícias Médicas © 2022 WebMD, LLC
Citar este artigo: Memória de trabalho visual pode ser potencializada com terapia a laser, diz estudo - Medscape - 29 de dezembro de 2022.
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