Ferramenta capaz de prever o risco de sofrer quedas graves pode ajudar a reduzir acidentes

Dra. Sheena Meredith

Notificação

23 de novembro de 2022

Uma nova ferramenta para identificar os pacientes que mais correm risco de quedas graves foi criada por pesquisadores da University of Oxford. A equipe disse que a ferramenta "pode ter um grande impacto na forma como os pacientes mais velhos são tratados no atendimento primário" e sugeriu que as estratégias de prevenção de quedas deveriam incluir "melhorias no direcionamento de tratamentos farmacológicos" e, particularmente, a possibilidade de interrupção do uso de anti-hipertensivos.

O risco de queda grave aumenta à medida que as pessoas envelhecem, principalmente em casos de doenças crônicas. Na Inglaterra, ocorrem anualmente cerca de 235.000 internações por queda de pessoas com mais de 65 anos, indicaram os pesquisadores. O custo para o National Health Service do Reino Unido é estimado em 2,3 bilhões de libras.

Muitos fatores interferem nesse risco, como doenças ou fragilidades preexistentes, e vários deles não são facilmente solucionados apenas com intervenção médica. Entretanto, um dos fatores que os médicos podem controlar é a quantidade e o tipo de medicamentos prescritos. O uso de anti-hipertensivos, por exemplo, se não for cuidadosamente monitorado, pode reduzir demais a pressão arterial e levar a uma diminuição temporária do fluxo sanguíneo cerebral, causando desmaio ou queda especialmente quando as pessoas se levantam.

Quedas podem levar à perda permanente da independência do paciente

As quedas podem ter forte impacto na qualidade de vida e não raro levam à perda permanente da independência dos idosos – as fraturas resultantes podem assinalar o momento no qual o paciente deixa de poder viver na sua própria casa ou sem acompanhamento.

A nova ferramenta, criada pelo Dr. Constantinos Koshiaris, especialista sênior em estatística médica no Nuffield Department of Primary Care Health Sciences da University of Oxford, utilizou dados de 1,7 milhão de registros de saúde anônimos coletados por 20 anos. Essas informações tiveram sua precisão verificada em comparação com um outro banco de dados, este com quase 4 milhões de registros de atendimentos em saúde.

O Dr. Constantinos disse: "No passado, tínhamos dificuldade para identificar na comunidade as pessoas com risco de queda. As ferramentas anteriores não eram muito precisas e, em alguns casos, apresentavam falhas metodológicas. Nossa nova ferramenta, STRATIFY-Falls, consegue prever quais pacientes têm mais risco de queda nos 10 anos subsequentes. Isto permite que o médico generalista faça um atendimento mais personalizado e adote estratégias de prevenção contra quedas para os pacientes, tais como o incentivo à prática de exercícios físicos ou a revisão das prescrições farmacológicas".

A pesquisa, publicada no periódico BMJ , foi um estudo de coorte retrospectivo feito a partir de prontuários da Clinical Practice Research Datalink (CPRD) contendo dados de cirurgias informados pelos médicos generalistas na Inglaterra entre 1998 e 2018. Ligando esses dados aos do hospital, os pesquisadores conseguiram identificar mais de 60.000 pessoas com 40 anos ou mais que tinham pelo menos uma aferição da pressão arterial elevada e tinham sofrido ao menos uma queda grave durante o período do estudo – queda grave foi definida como queda que exigiu tratamento hospitalar ou que levou à morte.

A análise foi feita com dados de 1.772.600 pacientes, que sofreram 62.691 quedas graves. Os pesquisadores utilizaram essas informações para criar um modelo dos fatores que poderiam prever o risco de queda das pessoas nos 10 anos subsequentes a uma aferição de pressão arterial elevada. O modelo final foi baseado em 24 preditores, como idade, sexo, etnia, consumo de bebidas alcoólicas, residência em uma região com baixos índices socioeconômicos, história de quedas, esclerose múltipla e uso de anti-hipertensivos, antidepressivos, hipnóticos e ansiolíticos.

Modelo diferenciou pacientes com baixo e com alto risco de queda em 10 anos

A equipe disse que o modelo "fez uma boa distinção entre os pacientes com baixo e com alto risco de quedas nos 10 anos subsequentes". A validação externa do modelo feito com dados de 3.805.366 pacientes que tiveram 206.956 quedas graves sugeriu potencial utilidade clínica, com benefício maior que o de outras estratégias.

"O modelo de previsão STRATIFY-Falls ajuda a reconhecer os indivíduos com alto risco de queda e pode ser usado por médicos que querem identificar os pacientes que possam se beneficiar de estratégias direcionadas à prevenção de quedas, como intervenções multifatoriais ou por meio de exercícios e revisão dos medicamentos prescritos", concluiu a equipe. Usado em conjunto com outras ferramentas de previsão, como as de risco cardiovascular, esse modelo pode ser útil como parte de uma avaliação de risco mais ampla para a prevenção de quedas.

A primeira autora do estudo, Dra. Lucinda Archer, professora de bioestatística no Centre for Prognosis Research da Keele University no Reino Unido, disse: "Descobrimos que história de quedas, diagnóstico de esclerose múltipla, alto consumo de bebidas alcoólicas, alto índice de privação e uso de medicamentos são todos fortes indicadores do risco de queda, condicionados a outras variáveis do modelo”.

"A ferramenta que desenvolvemos considera todos esses e outros fatores para determinar o risco de queda de uma pessoa nos 10 anos subsequentes", acrescentou a pesquisadora. "Após alguns mínimos ajustes, descobrimos que as previsões da nova ferramenta são muito precisas na diferenciação entre os grupos de pacientes com baixo e com alto risco de queda."

A ferramenta pode sinalizar automaticamente os pacientes de alto risco

O Dr. Richard McManus, coautor do estudo e professor de pesquisa em atendimento primário no Nuffield Department of Primary Care Health Sciences da University of Oxford, afirmou: "O médico generalista muitas vezes precisa equilibrar os riscos e os benefícios dos medicamentos para determinadas doenças, como o tratamento da hipertensão arterial em relação ao risco de eventos adversos, como as quedas. Ter ferramentas confiáveis para estimar o risco de cair de cada pessoa e poder mudar sua medicação para diminuir esse risco seria muito bom. Este tipo de ferramenta poderia ser incorporado aos sistemas de registros do médico generalista para indicar estes pacientes automaticamente".

A ferramenta será testada agora em um novo ensaio randomizado controlado que será feito com mais de 3.000 participantes com alto risco de quedas. Os indivíduos serão recrutados e acompanhados a partir do ano que vem para identificar se há menos quedas após a diminuição gradual do tratamento anti-hipertensivo.

Convidada pelo Medscape para comentar o estudo, Sindy Jodar, enfermeira sênior especializada em cardiologia na British Heart Foundation, disse: "A retirada gradual do medicamento pode ser tão importante quanto a prescrição, e é por isso que as revisões regulares dos medicamentos são tão importantes. Os pacientes que tomam anti-hipertensivos devem fazer uma revisão anual das prescrições, momento em que o médico irá conversar com ele sobre os riscos e balancear cuidadosamente os benefícios de continuar esses medicamentos, tendo em vista a probabilidade de potenciais problemas, como as quedas".

Abordagem "realmente promissora"

Caroline Abrahams, diretora da instituição filantrópica Age UK, disse ao Medscape: "Essa nova abordagem parece realmente promissora e esperamos que receba sinal verde na próxima fase de testes, para que possa começar a fazer a diferença para os idosos. Além de novas ferramentas preditivas, também precisamos de mais programas de prevenção de quedas, para que qualquer pessoa com alto risco de queda seja acompanhada e habilitada a reduzir este risco".

"As quedas causam tanto sofrimento e angústia em tantos idosos que é ótimo haver um novo olhar para a prevenção de sua ocorrência. Se pudermos reduzir o número de quedas e reduzir também a sua gravidade, melhoraremos a vida de muitas pessoas mais velhas e também salvaremos algumas, além de diminuir a sobrecarga em nosso serviço de saúde".

A pesquisa foi financiada por Wellcome Trust, Royal Society e National Institute for Health and Care Research. Os autores tiveram subsídios financeiro de Wellcome Trust, Royal Society e National Institute for Health and Care Research para o trabalho apresentado.

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