COMENTÁRIO

Meu paciente fuma cigarro eletrônico. Como devo orientá-lo?

Dr. Charles P. Vega

Notificação

7 de novembro de 2022

A escolha do Dr. Charles

Eu optaria pela segunda alternativa. Embora muito ainda precise ser compreendido sobre o equilíbrio dos potenciais riscos e benefícios associados ao uso de cigarros eletrônicos, há alguns dados sugerindo potenciais danos. Mas eu também consideraria o risco de Eusebio voltar a fumar cigarros comuns.

Eusebio tem uma história bastante típica de uso de cigarros eletrônicos, com início no ensino médio. Quando ele estava no ensino médio, houve um aumento acentuado do uso de cigarros eletrônicos na adolescência. De acordo com o estudo Monitoring the Future , as prevalências anuais de uso de cigarros eletrônicos entre estudantes dos Estados Unidos nos 8°, 10° e 12° anos escolares foram de 16,5%, 30,7% e 35,5%, respectivamente. Entretanto, a prevalência do uso de cigarros eletrônicos atingiu um patamar em 2020 antes de cair muito em 2021. Essa redução do uso de cigarros eletrônicos refletiu uma tendência mais ampla do uso de substâncias durante o confinamento da covid-19.

Os cigarros eletrônicos têm sido menos populares entre os adultos, embora tenha sido estimado que mais de 8 milhões de adultos nos EUA fumassem cigarros eletrônicos em 2018, e 14,9% de todos os adultos que participaram da National Health Interview Survey referiram ter fumado cigarros eletrônicos pelo menos uma vez. As variáveis associadas ao uso de cigarros eletrônicos foram sexo masculino, idade mais jovem, raça branca e baixa renda. Entretanto, o fator de risco mais comum para o uso de cigarros eletrônicos foi o uso atual ou pregresso de cigarros comuns.

Será que Eusebio está correto na sua suposição de que os cigarros eletrônicos são mais seguros do que os cigarros comuns? Não há dúvida sobre os efeitos negativos para a saúde dos cigarros comuns, mas os efeitos diretos dos cigarros eletrônicos sobre a saúde respiratória são mais controversos. Solventes usados nos cartuchos de cigarros eletrônicos, como propilenoglicol, podem causar irritação da nasofaringe e metaplasia escamosa. A nicotina atua diretamente nos gânglios parassimpáticos para causar broncoconstrição, o que pode resultar em alterações estruturais e funcionais da doença pulmonar obstrutiva crônica ao longo do tempo.

Os resultados de um estudo de coorte longitudinal sugerem que os cigarros eletrônicos sejam um fator de risco independente de incidência de doença respiratória. Este estudo acompanhou mais de 32.000 adultos nos EUA sem doença respiratória no início até referirem alguma doença respiratória durante um período de até quatro anos. Após o controle para as variáveis clínicas e demográficas e o uso de cigarros comuns, a razão de chances de doença respiratória associada ao uso atual ou pregresso de cigarros eletrônicos foi de 1,3. A razão de chances do uso atual de cigarros comuns foi de 2,6, e a razão de chances respectiva de uso combinado de cigarros eletrônicos e comuns foi de 3,3. Todos esses achados foram estatisticamente significativos.

Tendo sido amplamente introduzido no mercado dos EUA em 2007, ainda é cedo demais para avaliar os potenciais danos em longo prazo dos cigarros eletrônicos. Mas há um grande interesse no potencial benefício associado ao uso de cigarros eletrônicos: como uma ferramenta para promover a cessação do tabagismo dos cigarros comuns.

Eusebio tem uma história bastante comum de uso de cigarros eletrônicos como meio de parar de fumar cigarros comuns, e há evidências de ensaios clínicos que corroboram essa estratégia. Um estudo randomizado designou 886 adultos interessados em parar de fumar cigarros comuns para a reposição de nicotina ou os cigarros eletrônicos. O principal desfecho do estudo foi a abstinência de cigarros comuns um ano após a randomização.

A abstinência em um ano foi de 18,0% no grupo dos cigarros eletrônicos e de 9,9% na coorte de reposição de nicotina (risco relativo de 1,83; intervalo de confiança [IC] de 95% de 1,30 a 2,58). Entretanto, a continuação do uso de cigarros eletrônicos na 52ª semana foi de 80%, contra apenas 9% para a reposição de nicotina. As quedas da incidência de tosse e secreção foram maiores nos grupos dos cigarros eletrônicos, em comparação ao grupo da reposição de nicotina, mas a sibilância e a dispneia foram semelhantes nos dois grupos.

No entanto, pesquisas no mundo real não têm respaldado o uso de cigarros eletrônicos como adjunto para a cessação do uso de cigarros comuns. Uma metanálise publicada em 2021 confirmou que cigarros eletrônicos livres foram eficazes para a cessação do uso de cigarros comuns em ensaios clínicos randomizados, mas esse efeito não foi reproduzido na soma dos resultados de 55 estudos observacionais, independentemente da motivação dos fumantes para parar.

Além disso, a aplicação dos cigarros eletrônicos pode agravar a questão da dependência da nicotina em longo prazo. Em outra metanálise de quatro ensaios clínicos randomizados, a randomização para os cigarros eletrônicos foi associada a uma redução de 50% da taxa de abstinência de todos os produtos que contêm nicotina. No final do período de observação, as pessoas aleatoriamente designadas para o uso de cigarros eletrônicos tiveram um aumento de quase nove vezes da continuação do tratamento.

Eusebio e muitos adultos como ele podem ter trocado um mau hábito (cigarros comuns) por outro (cigarros eletrônicos). Como podemos ajudá-lo, ou ele precisa mesmo de ajuda? Eu preferiria errar por excesso de zelo e recomendar que ele parasse de fumar, se possível. Eu ofereceria orientação pessoal e por meio de grupos de apoio, e até especialistas em saúde mental se Eusebio estivesse interessado.

Neste momento, não aconselharia farmacoterapia a ajudar na abstinência dos cigarros eletrônicos. Não existem ensaios de qualidade que sugiram que medicamentos como a vareniclina ou a bupropiona sejam eficazes. Entretanto, a via pela qual essas substâncias promovem a abstinência dos cigarros comuns também pode funcionar para os cigarros eletrônicos, portanto, são necessárias mais pesquisas.

Qual é a sua experiência com cigarros eletrônicos? Eles ajudaram os pacientes, ou você vê o uso como prejudicial mesmo para fumantes de cigarros comuns? Você já viu efeitos negativos diretos do uso de cigarros eletrônicos? Deixe seu comentário. Obrigado.

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