Exposição pré-natal a altas doses de ácido fólico é associada a mais do dobro do risco de câncer para crianças de mães com epilepsia, sugerem novos dados de um registro escandinavo com mais de três milhões de gestações.
O aumento do risco de câncer não mudou após outros fatores que poderiam explicar esse risco serem considerados, como o uso de anticonvulsivos.
Não houve aumento do risco de câncer entre filhos de mães sem epilepsia que utilizaram altas doses de ácido fólico.
Os resultados deste estudo "devem ser considerados ao discutir os riscos e benefícios dos suplementos de ácido fólico para mulheres com epilepsia, e antes de as recomendações sobre a dose ideal serem decididas”, escreveram os autores.
“Embora acreditemos que a associação entre a dispensação da prescrição de altas doses de ácido fólico e o câncer em crianças nascidas de mães com epilepsia seja robusta, é importante ressaltar que estes são achados de um único estudo”, disse para o Medscape o primeiro autor do trabalho, o Dr. Håkon Magne Vegrim, médico afiliado à Universitetet i Bergen, na Noruega.
O estudo foi publicado on-line em 26 de setembro no periódico JAMA Neurology.
Riscos e benefícios
As mulheres com epilepsia são orientadas a tomar altas doses de ácido fólico antes e durante a gestação, devido ao risco de malformações congênitas associadas aos anticonvulsivos. Não se sabe se as altas doses de ácido fólico estão associadas ao aumento do risco de câncer na infância. Para investigar, os pesquisadores analisaram dados de registro da Dinamarca, da Noruega e da Suécia, relativos a 3,3 milhões de crianças acompanhadas até uma idade mediana de 7,3 anos.
Entre as 27.784 crianças nascidas de mães com epilepsia, 5.934 (21,4%) foram expostas a altas doses de ácido fólico (dose média de 4,3 mg), com 18 casos de câncer com exposição, em comparação a 29 casos de câncer sem exposição, produzindo uma razão de risco ajustada de 2,7 (intervalo de confiança [IC] de 95% de 1,2 a 6,3).
O risco absoluto com a exposição foi de 1,5% (IC 95% de 0,5% a 3,5%) em crianças de mães com epilepsia, em comparação a 0,6% (IC 95% de 0,3% a 1,1%) em crianças de mães com epilepsia que não tomaram altas doses de ácido fólico.
A exposição pré-natal a altas doses de ácido fólico não foi associada a aumento do risco de câncer entre as crianças de mães sem epilepsia.
Entre as crianças de mães sem epilepsia, 46.646 (1,4%) foram expostas a altas doses de ácido fólico (dose média de 2,9 mg), com 69 casos de câncer entre crianças expostas e 4.927 casos de câncer entre crianças não expostas – razão de risco ajustada de 1,1 (IC de 95% de 0,9% a 1,4) e risco absoluto de 0,4% (IC de 95% de 0,3% a 0,5%).
Não houve associação entre nenhum anticonvulsivo específico e o câncer na infância.
"A remoção das mães com dispensação de prescrição de carbamazepina e valproato não foi associada à estimativa pontual. Portanto, esses dois anticonvulsivos não foram modificadores importantes do efeito de associação do câncer", observaram os pesquisadores no estudo.
Eles também pontuaram que os tipos de câncer mais comuns na infância em crianças entre mães com epilepsia que tomaram altas doses de ácido fólico não diferiram da distribuição na população geral.
"Precisamos adquirir mais conhecimento sobre os potenciais mecanismos por trás das altas doses de ácido fólico e do câncer na infância, e é importante identificar a dose ideal para equilibrar os riscos e benefícios – e se a suplementação com ácido fólico deve ser mais individualizada, com base em fatores como o nível sérico de folato e que tipo de anticonvulsivo está sendo usado", disse Dr. Håkon.
Mudança de conduta?
Convidada pelo Medscape a comentar o estudo, a médica Dra. Elizabeth E. Gerard, diretora do Women with Epilepsy Program e professora associada de neurologia na Northwestern University nos Estados Unidos, disse: "Existem benefícios conhecidos da suplementação com ácido fólico durante a gestação, como a redução de defeitos do tubo neural na população geral e melhores resultados do desenvolvimento neurológico de crianças nascidas de mães com e sem epilepsia".
"No entanto, apesar de algumas diretrizes de especialistas recomendarem suplementação com altas doses de ácido fólico, não existe certeza quanto à dose “certa” para as pacientes com epilepsia que podem engravidar", disse Dra. Elizabeth, que não participou do estudo.
A Dra. Elizabeth, membro da American Epilepsy Society, observou que outros estudos epidemiológicos sobre suplementação de ácido fólico e câncer tiveram "resultados contraditórios, portanto, serão necessárias mais pesquisas sobre esta associação. Além disso, diferenças no metabolismo do folato materno-fetal e dos níveis sanguíneos podem ser um fator importante a ser estudado no futuro.
"Dito isso, este estudo definitivamente deve fazer com que paremos e reavaliemos a prática de suplementação de altas doses de ácido fólico para pacientes com epilepsia que estão considerando engravidar", disse Dra. Elizabeth.
O estudo foi apoiado pelo NordForsk NordNordic Program on Health and Welfare. O Dr. Håkon Magne Vegrim e a Dra. Elizabeth E. Gerard informam não ter conflitos de interesse.
JAMA Neurol. Publicado on-line em 26 de setembro de 2022. Texto completo
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Citar este artigo: Altas doses de ácido fólico durante a gestação ligadas a risco de câncer para crianças - Medscape - 10 de outubro de 2022.
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