O avanço das tecnologias digitais no atendimento a pacientes requer o desenvolvimento de habilidades já estabelecidas no contexto clínico tradicional e, apesar de uma anamnese bem feita, o questionamento da qualidade do exame físico, etapa importante para corroborar ou direcionar o tratamento do paciente, está em constante discussão.
Apesar de o exame físico poder ter início com a observação do paciente antes mesmo da entrada no consultório médico, o uso de estratégias direcionadas pode ajudar o profissional a ganhar maior valor clínico com as informações coletadas. Os modelos para essa etapa são diversos: o governo inglês, por exemplo, lançou o "Telehealth Ten", um guia com 10 passos que investigam de sinais vitais a determinantes sociais de saúde para um exame clínico mais completo, especialmente de pacientes em condições crônicas.
As teleconsultas também apresentam especificidades relacionadas com o quadro clínico do paciente e a especialidade médica em questão. e pela natureza das especialidades médicas. Cada especialidade tem discutido como integrar este formato de atendimento em sua realidade.
"A minha especialidade, a coloproctologia, é muito sensível. Então optei por não aderir à telemedicina até agora, exatamente pela questão do exame físico. Mas ela [a telemedicina] pode me ajudar no retorno ou na primeira entrevista, servindo de ponte para o consultório", comentou a Dra. Maria Augusta Souza, coloproctologista e cirurgiã geral de aparelho digestivo.
Além da variabilidade dada em relação ao momento e à especialidade, ainda temos que considerar que, para a realização do exame físico, podemos contar com diferentes situações do lado do paciente: ter um médico generalista ou assistente presente no local para a realização do exame; ter o paciente sozinho nesta ocasião; contar com apoio ou não de dispositivos móveis, dentre outras.
Para o Dr. Fernando Carbonieri, médico e CEO do Academia Médica, há um processo de adaptação do que é praticado na propedêutica tradicional para o que pode ser feito em ambientes digitais, e o cenário é bastante animador. Ele lembrou de uma citação de Randy Parker, fundador da MDLIVE, uma empresa de telemedicina americana: "Você pode ser um médico incrível e, mesmo assim, não ser um ótimo médico para telemedicina."
Segundo o Dr. Fernando, há inúmeras equivalências para a avaliação. Por exemplo, no caso da Manobra de Punho Percussão de Murphy e Sinal de Giordano. "Para o exame à distância, você pode pedir para que o paciente fique na ponta dos pés e caia sobre seus calcanhares. Após realizar este movimento, o paciente pode relatar o que sentiu, e isso seria o equivalente ao contexto tradicional." E completou: "Acompanhando a realização deste autoexame, você consegue sugerir uma analgesia precoce antes de o paciente se deslocar, por exemplo, para um serviço de emergência."
Outro exemplo dado pelo Dr. Fernando: Para verificar a frequência respiratória, é possível observar o movimento de expansão do tórax ou, até mesmo, avaliar as pausas na fala do paciente, avaliando o uso de musculaturas acessórias para a respiração, como batimento das aletas nasais ou tiragens.
Para examinar lesões de pele, a videochamada pode ser insuficiente, pois a resolução costuma ser baixa e não é possível aproximar/aumentar a imagem. Nessas situações, o Dr. Fernando sugere que seja solicitado ao paciente que encaminhe uma foto da lesão. Dessa forma, é possível fazer uma avaliação mais detalhada. Solicite também que o paciente pressione a lesão na frente da câmera e, assim, avalie o desaparecimento à digito-compressão.
Ele lembrou que, em alguns casos, as mãos do paciente podem fazer o papel das mãos do profissional de saúde. "Alguns irão desempenhar melhor ou pior essa atividade, mas é possível explorá-la", argumentou.
Não é segredo, nem novidade, que a telemedicina veio para ficar e que está em constante evolução. Muitos profissionais não a adotaram no começo da liberação, mas agora entendem que pode fazer parte de alguns momentos da jornada, diminuindo custos e aumentando o acesso dos pacientes, por exemplo.
É importante que a ciência aplicada à propedêutica continue evoluindo e que o profissional de saúde esteja cercado de ferramentas que apoiem todo o arcabouço tecnológico e de dados para o acompanhamento dos pacientes, como prontuário eletrônico – seguro e estruturado –, por exemplo.
Nathalia Nunes é fonoaudióloga pela Universidade de São Paulo com MBA em Economia e Gestão em Saúde pela Unifesp. Atua como Head de Expansão na Prontmed.
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Citar este artigo: Telemedicina: adaptação da propedêutica a um novo contexto - Medscape - 15 de setembro de 2022.
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