Uso de Cannabis para dor ligado a discreto risco de arritmia

Marlene Busko

Notificação

27 de agosto de 2022

Os pacientes que receberam uma primeira prescrição de Cannabis por dor crônica tiveram maior probabilidade de abrir um quadro de arritmia – bradicardia, taquicardia ou distúrbio da condução – nos seis primeiros meses em comparação a pacientes semelhantes que não usam Cannabis, em um novo estudo de caso com controle.

Não houve diferenças entre os grupos em termos de incidência de insuficiência cardíaca ou síndrome coronariana aguda.

Os pesquisadores identificaram 5.071 pacientes em um registro nacional dinamarquês que pegaram na farmácia pelo menos uma prescrição de Cannabis medicinal para tratar a dor crônica e parearam cada paciente com cinco pacientes do mesmo sexo, faixa etária e tipo de dor crônica, que não receberam este tratamento.

O risco relativo de arritmia foi 83% maior entre os que usaram Cannabis medicinal do que entre os outros pacientes, disse por e-mail ao Medscape e autora do estudo, a Dra. Nina Nouhravesh.

No entanto, os riscos absolutos de arritmia foram discretos – risco de 0,86% (intervalo de confiança, IC, de 95%, de 0,61% a 1,1%) para os consumidores de Cannabis medicinal versus risco de 0,47% (IC de 95%, de 0,38% a 0,56%) para os que não utilizaram Cannabis medicinal.

"Como o uso medicinal da Cannabis é relativamente novo para um grande mercado de pacientes com dor crônica, é importante investigar e descrever os efeitos colaterais graves", disse Dra. Nina, do Herlev-Gentofte Hospital, na Dinamarca.

Os resultados do estudo, disse a pesquisadora, sugerem que "pode haver um risco ainda não descrito de arritmia após o uso medicinal da Cannabis".

"Embora a diferença absoluta de risco seja pequena, tanto os pacientes como os médicos devem ter o máximo de informação possível ao pesarem os prós e os contras de qualquer tratamento", disse Dra. Nina, acrescentando que "as conclusões deste estudo suscitam preocupações tanto para o uso legal como ilegal de Cannabis no mundo inteiro".

Os resultados deste estudo foram apresentados em 27 de agosto no congresso de 2022 da European Society of Cardiology (ESC), em Barcelona (Espanha).

Cedo demais para dizer?

No entanto, o Dr. Brian Olshansky, que não participou da pesquisa, adverte que é importante considerar várias limitações do estudo antes de lucubrar implicações clínicas.

"Outros dados e relatos consideraram a possibilidade de arritmias pelo uso da maconha, e os dados vão em ambas direções", disse o Dr. Brian, eletrofisiologista cardíaco clínico e professor emérito da University of Iowa Hospitals, nos Estados Unidos, por e-mail ao Medscape.

"Vale ressaltar que as arritmias, em si, não trazem necessariamente consequências", destacou. "Em qualquer caso," acrescentou, os riscos no presente estudo são "extraordinariamente baixos".

Bradicardia sinusal, taquicardia sinusal e contrações atriais ou ventriculares prematuras podem ser inteiramente benignas, disse. Por outro lado, arritmias podem indicar a ocorrência de fibrilação atrial, taquissistolia (flutter) atrial, taquicardia ventricular e fibrilação ventricular, potencialmente perigosas.

Pode haver um grupo específico de "alto risco" que possa evoluir com arritmias potencialmente graves, sugeriu o Dr. Brian.

"Não há evidências de que nenhum desses pacientes tenha sido submetido ou necessitado de tratamento para sua arritmia ou que parar ou iniciar os canabinoides tenha alterado a arritmia de uma maneira ou de outra", disse. "Além disso, não há relação entre a dose e os episódios de arritmia".

Mais pacientes no grupo da Cannabis medicinal do que no grupo que não usou Cannabis também estavam tomando opioides (49% vs. 30%), anti-inflamatórios não esteroides (24% vs. 19%), antiepilépticos (35% vs. 23%) ou antidepressivos tricíclicos (11% vs. 4%), observou o especialista.

Em resumo, segundo Dr. Brian, "estes dados não constituem uma preocupação óbvia em termos de saúde e não trazem nenhum tipo de conhecimento vital para os médicos que prescrevem Cannabis".

"Minha preocupação é que essas informações serão exageradas", advertiu. "Se os canabinoides realmente têm benefícios em termos de redução da dor, seu uso pode ser reduzido com base no medo de uma possibilidade de arritmia, quando o risco de uma arritmia, em qualquer caso, é muito pequeno e indefinido em termos de sua gravidade".

Dor oncológica, musculoesquelética e neurológica

Nesta análise, os pesquisadores identificaram 1,8 milhões de pacientes na Dinamarca que foram diagnosticados com dor crônica entre 2018 e 2021.

Destes, cerca de 5.000 pacientes tinham pegado pelo menos uma prescrição de Cannabis (dronabinol 29%, canabinoides 46% ou canabidiol 25%).

Os pacientes tinham mediana de idade de 60 anos e 63% eram mulheres.

Os consumidores de Cannabis tinham recebido essa prescrição para dores musculoesqueléticas (35%), oncológicas (18%), neurológicas (14%) ou outras (33%), disse a Dra. Nina. 

Os pesquisadores e o Dr. Brian Olshansky não têm conflitos de interesse.

European Society of Cardiology (ESC) Congress 2022. O Abstract foi apresentado neste sábado, 27 de agosto.

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