Covid-19: Nível de células B deve ser contado antes do reforço vacinal em pacientes com esclerose múltipla

Kelli Whitlock Burton

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9 de junho de 2022

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Pacientes com esclerose múltipla tratados com rituximabe (um medicamento que promove a depleção das células B) que ainda não tiverem sido vacinados contra a covid-19 devem tomar o primeiro ciclo vacinal o quanto antes – e aguardar até que seus níveis de células B aumentem antes de receber a dose de reforço, diz nova pesquisa.

Em um estudo de coorte prospectivo, 90% dos pacientes em uso de rituximabe e nível ≥ 40 células B/µL montaram resposta imunitária adequada à vacina da Pfizer, no entanto, o número de anticorpos produzidos por pacientes com níveis linfocitários mais baixos foi significativamente menor.

Os resultados também mostraram grande variação no tempo necessário para a restauração adequada das células B. Alguns pacientes levaram um ano ou mais até a adequação dos níveis linfocitários.

Os achados levaram o hospital onde o estudo foi realizado a suspender o tratamento com rituximabe até que os pacientes fossem vacinados. Estes achados também incitaram os pesquisadores a solicitar novas diretrizes para a administração do esquema vacinal de acordo com os níveis de células B em detrimento dos critérios atuais, pautados no tempo transcorrido desde a última vacinação.

Dr. Joachim Burman

"Não faz sentido seguir uma recomendação cujo parâmetro é o tempo transcorrido desde o último tratamento", disse ao Medscape o médico e pesquisador do estudo Dr. Joachim Burman, Ph.D., neurologista de referência do Akademiska sjukhuset e professor associado da Uppsala universitet na Suécia.

"Confunde e é potencialmente prejudicial para os pacientes", disse o Dr. Joachim.

Os achados foram publicados on-line em 11 de maio no periódico JAMA Network Open.

Encontrando o ponto de corte

Fármacos como o rituximabe têm como alvo a CD20, uma proteína encontrada na superfície das células B, promovendo a depleção das células B.

O rituximabe é o tratamento mais comum da esclerose múltipla na Suécia. O fármaco é aprovado nos Estados Unidos para tratar artrite reumatoide e algumas formas de câncer, mas não é aprovado para o tratamento da esclerose múltipla.

Pesquisas anteriores mostraram que a resposta imunitária às vacinas anticovídicas foi menor entre os pacientes que faziam tratamento direcionado às células B do que entre a população geral. Isso não foi exatamente surpreendente, dado que os estudos encontraram uma resposta imunitária igualmente enfraquecida a outras vacinas.

Mas ainda não havia um limiar conhecido do nível de células B suficiente para montar uma resposta imunitária aceitável após a vacinação anticovídica.

Os pesquisadores recrutaram 67 pacientes para o estudo. Destes, 60 tinham feito tratamento com rituximabe, e sete não tinham usado rituximabe.

Cerca de seis meses após a última dose do rituximabe, 40% dos pacientes apresentavam contagem de células B < 10/μL. Neste grupo, a duração do tratamento com rituximabe foi o único fator significativamente associado à mobilização mais lenta das células B (mediana de duração de 4,0 anos versus 2,1; p = 0,002).

É necessário um controle rigoroso

Seis semanas após a vacinação com a vacina de ácido ribonucleico mensageiro (ARNm) fabricada pela Pfizer, 28% dos pacientes não conseguiram montar uma resposta imunitária adequada. Entre esses pacientes, a mediana da contagem de células B foi de 22/μL vs. 51/μL para o restante da coorte (p < 0,001).

Um valor de corte de 40/μL rendeu níveis adequados de anticorpos IgG (imunoglobulina G) contra a espícula do SARS-CoV-2 em 90% dos pacientes e uma forte resposta imunitária anti-RBD em 72% dos casos.

Os participantes do estudo registraram uma resposta adequada das células T à vacina, sugerindo pelo menos algum nível de proteção.

Como os pacientes com esclerose múltipla têm mais risco de covid-19 grave, os pesquisadores recomendam que estes pacientes recebam o ciclo inicial da vacina anticovídica assim que possível, mas que aguardem até a contagem de células B chegar a 40/µL antes de tomar a dose de reforço.

Em relação ao momento da dose de reforço, "os resultados sugerem fortemente que não seja imediata, nem com base em diretrizes genéricas", disse o Dr. Joachim.

"Os valores das células B devem ser monitorados de perto, e a vacina administrada novamente quando essas células B chegarem a 40 células/µL", acrescentou o pesquisador.

O Dr. Joachim disse que espera que seus achados se apliquem à outra vacina de ARNm e a qualquer outro tratamento direcionado às células B.

Cedo demais para dosar as células B?

Convidado pelo Medscape a comentar o estudo, o médico Dr. Robert J. Fox, neurologista da equipe do Mellen Center for MS e vice-presidente de pesquisa no Neurological Institute da Cleveland Clinic, nos Estados Unidos, disse que o limiar de células B identificado no estudo é muito maior do que o que costuma ser visto nos pacientes tratados com ocrizumabe, um fármaco anti-CD20 das células B aprovado nos EUA para tratar a esclerose múltipla.

Dr. Robert Fox

"As decisões sobre o intervalo terapêutico precisam equilibrar a eficácia no tratamento da esclerose múltipla com a segurança, o que engloba a resposta vacinal", disse Dr. Robert, que não participou do estudo.

"Dado o desconhecimento da eficácia destes intervalos prolongados, não me parece que estejamos aptos a fazer recomendações de conduta baseadas nas contagens de células B", acrescentou.

No entanto, o Akademiska sjukhuset, onde o estudo foi realizado, e outros centros na Suécia decidiram adotar esta estratégia. Estas instituições suspenderam a administração de rituximabe para os pacientes com esclerose até que fossem vacinados. Para os pacientes recém-diagnosticados com esclerose múltipla, o tratamento foi iniciado com outro fármaco modificador da doença, e para os pacientes com indicação de infusão de rituximabe, o tratamento foi postergado.

Apenas um paciente apresentou recidiva leve da esclerose múltipla durante a suspensão do rituximabe. Ele entrou em remissão em uma semana, informou Dr. Joachim.

“Desde que o Bar-Or report mostrando que a resposta humoral às vacinas é acentuadamente menor nos pacientes com esclerose múltipla tratados com esquemas anti-CD20, os médicos vêm lutando para equacionar essas questões de segurança relacionadas ao tratamento com anticorpos monoclonais anti-CD20 e o benefício clínico dessa classe terapêutica", disse Dr. Robert.

"Dado que na pandemia da covid-19 estamos tateando no escuro, os médicos fizeram avaliações e tomaram as melhores decisões possíveis diante da escassez de dados", observou o comentarista.

"Neste momento, não sabemos quais decisões estavam corretas ou erradas, mas certamente não acho que devemos julgar os médicos por fazer o melhor que podiam."

O estudo foi financiado pela Engkvist Stiftelse, pela Marianne och Marcus Wallenberg Stiftelse e pela Svenska Sällskapet för Medicinsk Forsknin . Dr. Joachim Burman informou não ter conflitos de interesse. O Dr. Robert J. Fox recebeu honorários de consultoria da Genentech/Roche, Biogen e de outras empresas que produzem fármacos para tratar a esclerose múltipla.

JAMA Netw Open. Publicado on-line em 11 de maio de 2022. Texto completo

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