Estudo mostra que a perda ponderal importante diminui chances de covid-19 grave

Dr. Mitchel L. Zoler, Ph.D.

Notificação

10 de janeiro de 2022

Pessoas com obesidade que tiveram grande perda ponderal após a cirurgia bariátrica (metabólica) apresentaram menor risco de complicações graves por covid-19 do que as pessoas pareadas por obesidade, que não fizeram cirurgia e não tiveram perda ponderal tão importante.

Os resultados de uma revisão retrospectiva observacional de quase 12 mil pacientes em um único centro nos Estados Unidos mostraram que pessoas com obesidade que fizeram cirurgia bariátrica perderam uma quantidade de peso corporal, em média, quase 19% maior do que as pessoas de controle pareadas por obesidade que não fizeram cirurgia durante um acompanhamento mediano de quase oito anos.

Entre as quase 800 pessoas do grupo do estudo que tiveram covid-19 durante o primeiro ano da pandemia, as que fizeram cirurgia bariátrica tiveram um risco 49% menor de hospitalização, 63% menor de necessidade de aporte de oxigênio e 60% menor de covid-19 "grave", em comparação ao grupo de controle. Covid-19 grave foi definida como necessidade de ventilação mecânica ou morte. O número de mortes por todas as causas foi 73% menor entre as pessoas que fizeram a cirurgia, mas essa diferença não foi significativa (P = 0,09).

A obesidade é um "fator de risco modificável" de covid-19 grave

Os resultados "demonstram claramente que a obesidade é um fator de risco modificável" de quadros mais graves de covid-19, disse o médico Dr. Ali Aminian, primeiro autor do artigo publicado on-line em 29 de dezembro.

"Não é viável fazer um ensaio clínico randomizado com um grande número de pacientes com obesidade para avaliar os desfechos da covid-19 após uma intervenção de perda ponderal", observou Dr. Ali, professor de cirurgia e diretor do Bariatric and Metabolic Institute da Cleveland Clinic. "Portanto, esses dados oferecem as melhores evidências disponíveis" sobre o efeito da perda substancial e sustentada de peso, e o risco de complicações mais graves pela covid-19, disse ele em uma entrevista.

"A covid-19 deve agora ser acrescentada à longa lista de comorbidades da obesidade que podem ser mitigadas pela cirurgia bariátrica", concluiu um comentarista convidado que acompanhou o novo estudo.

Os novos dados sugerem de forma robusta "que a perda substancial do peso reduz o risco associado de covid-19 grave relacionado com a obesidade nas pessoas infectadas", comentou o médico Dr. Lee M. Kaplan, PhD, diretor do Weight Center no Massachusetts General Hospital nos EUA, que não participou do estudo.

É "um estudo muito bom, que traz um argumento eloquente", acrescentou. "Um estudo prospectivo e randomizado talvez nunca seja feito, então é preciso lidar com os dados que se tem, e estes dados são bons."

Outro achado a ressaltar foi que a incidência de covid-19 foi quase idêntica entre as pessoas que fizeram cirurgia bariátrica e os controles, com prevalência de casos de infecção de março de 2020 a março de 2021 de cerca de 9% nos dois grupos.

"O risco infecção foi o mesmo, porém o índice de complicações entre os que fizeram cirurgia bariátrica e tiveram perda ponderal importante foi muito menor, disse o médico Dr. Steven E. Nissen, autor sênior do estudo e diretor acadêmico do Heart, Vascular and Thoracic Institute da Cleveland Clinic.

Tudo se resume à perda ponderal

A redução das complicações provavelmente "se resume à perda ponderal, não à cirurgia", acrescentou Dr. Steven em uma entrevista. "Se uma pessoa tiver perdido uma quantidade similar de peso por outros meios, acredito que provavelmente terá o mesmo benefício". Mas o médico reconheceu que o novo estudo não traz evidências diretas a esse respeito.

"As pessoas com obesidade adoecem mais quando pegam covid-19. Se a pessoa perder peso, terá menos risco de apresentar um quadro infeccioso grave”, previu Dr. Steven.

"Esta é outra boa razão para tratar a obesidade. O estudo mostra que a perda substancial de peso vale a pena", embora a diminuição das complicações relacionadas com a covid-19 seja apenas mais uma das mais de 200 comorbidades diferentes com melhora comprovada diante da perda ponderal, observou Dr. Lee.

Por isso, o médico demonstrou ceticismo em relação à possível repercussão dessas novas evidências no número de pessoas com obesidade buscando a cirurgia bariátrica ou outros meios para obter uma perda ponderal significativa. Mesmo antes da covid-19, existiam boas evidências do "enorme valor de tratar a obesidade com eficácia", disse Dr. Lee em uma entrevista.

O Dr. Lee também está de acordo que a perda substancial de peso induzida por outras estratégias, como o tratamento com potentes medicamentos para perda ponderal, por exemplo, a semaglutida, a tirzepatida e a cagrilintida (ambas ainda experimentais), provavelmente tenha um impacto semelhante.

"O estudo mostra que a perda substancial de peso pode mitigar as complicações da covid-19. Atualmente, essa perda ponderal é alcançada de forma mais eficiente com a cirurgia bariátrica, mas futuramente várias novas intervenções farmacológicas poderão produzir resultados semelhantes”, disse Dr. Lee.

Detalhes do estudo

O estudo começou com toda a coorte de mais de 675 mil pacientes atendidos na Cleveland Clinic entre 2004 e 2017, com pelo menos um registro do índice de massa corporal ≥ 35 kg/m2. Desse grupo, os pesquisadores identificaram mais de cinco mil pacientes que fizeram cirurgia bariátrica e mais de 15 mil controles pareados que não fizeram a cirurgia.

A comparação entre esses dois grupos mostrou que, durante um acompanhamento mediano de 7,6 anos, a média do incremento de perda ponderal entre as pessoas que fizeram a cirurgia comparada às que não fizeram foi uma redução de 18,6 pontos percentuais em relação ao peso corporal inicial.

Dessa coorte inicial, com um total de pouco mais de 20 mil pacientes, 2.958 do grupo da cirurgia e 8.851 dos controles estavam disponíveis para avaliação de covid-19 no período de 12 meses de 1º de março de 2020 a 1º de março de 2021. Nesta janela de 12 meses, 206 pacientes do grupo da cirurgia e 578 dos controles tiveram covid-19. No momento do resultado positivo do teste do SARS-CoV-2, o peso médio dos pacientes infectados que fizeram a cirurgia era de 108,4 kg e o dos controles infectados era de 128,4 kg.

O estudo foi financiado por subsídios da Medtronic. O Dr. Ali Aminian recebeu apoio financeiro e honorários como palestrante da empresa Medtronic. O Dr. Steven E. Nissen recebeu financiamento de pesquisa das empresas Abbvie, Amgen, AstraZeneca, Bayer, Bristol Myer Squibb, Esperion, Lily, Novartis e Silence. O Dr. Lee M. Kaplan prestou consultoria para as empresas Amgen, Ethicon, Gelesis, Lilly, Novo Nordisk, Pfizer, Rhythm e Xeno.

JAMA Surg. Publicado em 29 de dezembro de 2021; doi:10.1001/jamasurg.2021.6496

O Dr. Mitchel L. Zoler, Ph.D. é repórter para o Medscape e o MDedge residente na região da Filadélfia. @mitchelzoler

Siga o Medscape em português no Facebook, no Twitter e no YouTube

Comente

3090D553-9492-4563-8681-AD288FA52ACE
Comentários são moderados. Veja os nossos Termos de Uso

processing....