Rivaroxabana reduz risco de tromboembolia venosa com segurança após hospitalização por covid-19: ensaio clínico MICHELLE

Patrice Wendling

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30 de dezembro de 2021

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O ensaio multicêntrico randomizado MICHELLE sugere que a anticoagulação prolongada com rivaroxabana em dose baixa após a hospitalização por covid-19 pode reduzir o risco de tromboembolia venosa (TEV), sem piorar o risco de sangramento, em pacientes que foram considerados de alto risco para TEV.

No estudo aberto, que incluiu 320 pacientes, o desfecho primário de eficácia ocorreu em cinco (3%) pacientes alocados no grupo que recebeu rivaroxabana e em 15 (9%) que não receberam anticoagulação após a alta, uma diferença significativa.

O desfecho composto de eficácia consistiu em TEV sintomático ou letal, TEV assintomático em ultrassonografia venosa de membro inferior bilateral e angiotomografia pulmonar computadorizada, tromboembolia arterial sintomática e morte por evento cardiovascular até o 35º dia.

Houve benefício que totalizou uma queda de dois terços no risco para o grupo tratado com rivaroxabana, com um risco relativo (RR) de 0,33 (intervalo de confiança, IC, de 95% de 0,13 a 0,90; P = 0,029) e número necessário para tratar (NNT) de 16 para se prevenir um evento. O achado foi motivado principalmente pelo excesso de embolia pulmonar no grupo de controle, que respondeu por três mortes.

De acordo com os critérios da International Society on Thrombosis and Hemostasis, não ocorreu nenhum sangramento importante nos grupos do estudo. As incidências de sangramento clinicamente relevante sem gravidade foram semelhantes, com dois eventos em ambos os grupos do estudo MICHELLE, cujos resultados foram publicados em 15 de dezembro no periódico The Lancet.

"Apesar de o estudo não ser tão grande, são dados randomizados importantes", disse ao Medscape o primeiro autor do estudo, Dr. Eduardo Ramacciotti, médico do Science Valley Research Institute em São Paulo.

Em relação à possibilidade de os resultados poderem ser extrapolados para outros anticoagulantes orais de ação direta, como apixabana, dabigatrana ou edoxabana, "a resposta é não, eles são diferentes", disse o Dr. Eduardo.

“Nós defendemos fortemente a manutenção do que encontramos neste estudo, e estudamos a rivaroxabana, não outros anticoagulantes orais de ação direta. Não acreditamos que seja um efeito de classe”.

O estudo MICHELLE foi inspirado pelo grande número de casos de tromboembolias pulmonares (TEP) observados após a alta hospitalar seguinte a internação por covid-19, bem como por recomendações incompatíveis sobre o papel da profilaxia antitrombótica de duração prolongada após a alta, disse ele. Embora haja um consenso em desenvolvimento sobre a dose ideal de heparina na assistência hospitalar, não há consenso sobre a tromboprofilaxia estendida após a alta.

Para o estudo, 318 pacientes tratados com tromboprofilaxia padronizada com heparina por pelo menos três dias durante uma hospitalização por covid-19 foram randomizados para receber uma prescrição de rivaroxabana (10 mg/dia por 35 dias) no momento da alta hospitalar ou nenhuma anticoagulação.

Na alta, todos os pacientes (média de idade de 57,1 anos; 40% de mulheres) tinham risco aumentado de TEV, definido por escore de risco IMPROVE TEV ≥ 4, ou 2 a 3 com dímero D > 500 ng/mL.

Destaca-se o fato de o estudo ter excluído pacientes com fatores de risco de sangramento como trombocitopenia, insuficiência renal, sangramento ou cirurgia recentes, úlcera gástrica ou uso de ácido acetilsalicílico ou clopidogrel.

Segundo o Dr. Eduardo, os pesquisadores restringiram o grupo de pacientes elegíveis para receber a rivaroxabana. "Portanto, acreditamos que metade dos pacientes que recebem alta hospitalar seriam elegíveis para receber tromboprofilaxia com rivaroxabana. Esta é uma mensagem importante. Não é para todos os pacientes, mas para este grupo muito específico de pacientes com alto risco de tromboembolia e baixo risco de sangramento."

Os pontos fortes do MICHELLE incluem o desenho randomizado, o fato de ser multicêntrico (14 locais), o que aumenta sua validade externa, e o uso de rivaroxabana em baixas doses, apropriada para esta fase do tratamento, afirmaram as médicas Dra. Charlotte Bradbury, da University of Bristol, na Inglaterra, e a Dra. Zoe McQuilten, da Monash University, na Austrália, no editorial que acompanha o estudo.

As editorialistas ressaltaram que, no estudo ACTION, a dose terapêutica de rivaroxabana intra-hospitalar e pós-alta por 30 dias não foi superior à heparina em dose profilática e foi associada a um maior risco de sangramento.

As limitações do MICHELLE, escreveram as médicas, são o desenho aberto, o tamanho amostral relativamente pequeno e um maior número de exames feitos no grupo que recebeu rivaroxabana, possivelmente aumentando o número de diagnósticos de TEV.

Outra limitação foi que o desfecho primário incluiu TEV assintomático, TEP subsegmentar e trombose distal de significado menos evidente. Dito isto, o desfecho secundário de eficácia de TEV sintomático e letal foi reduzido com rivaroxabana (RR = 0,13; IC 95% de 0,02 a 0,99; P = 0,049), apontaram as editorialistas.

"Esses resultados são animadores, mas, em vista do pequeno tamanho deste estudo, os médicos provavelmente aguardarão os resultados de outros trabalhos em andamento (...) que estão avaliando a tromboprofilaxia pós-alta antes de mudar a prática padrão e as recomendações das diretrizes", concluíram as Dras. Charlotte e Zoe. Esses ensaios clínicos, registraram elas, incluem os estudos HEAL-COVID, ACTIV-4c, XACT e um catalogado como NCT04508439.

O estudo MICHELLE teve o suporte do Science Valley Research Institute Brasil e da Bayer, que forneceram o medicamento do estudo e parte do apoio financeiro. O Dr. Eduardo declarou ter recebido doações e honorários de consultoria da Bayer e da Pfizer; bolsas do Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil; e contribuições pessoais sem relação com o estudo em tela da Aspen Pharma, Biomm Pharma e Daiichi Sankyo. A Dra. Charlotte recebeu honorários como palestrante da Bayer para educação não promocional e financiamento de conferências da Bayer para apresentar dados de pesquisa sem relação com a rivaroxabana. Ela também informou o recebimento de honorários como palestrante da Amgen, Bristol Myers Squibb/Pfizer Alliance, Janssen, Eli Lilly e Novartis; apoio para participação em conferências da Amgen e Novartis; e contribuições por consultoria a Ablynx, Bristol Myers Squibb/Pfizer Alliance, Lilly, Novartis e Portola. A Dra. Zoe informou não ter conflitos de interesses.

Lancet. Publicado em 15 de dezembro de 2021. Full text , Editorial

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