Covid-19: mortalidade mais alta entre pacientes psiquiátricos continua sendo um mistério

Pauline Anderson

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13 de outubro de 2021

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Os antipsicóticos não são responsáveis pelo aumento da mortalidade relacionada com a covid-19 entre os pacientes com doença mental grave, revelam novas pesquisas.

O aumento expressivo da mortalidade por covid-19 entre pacientes com esquizofrenia e transtorno esquizoafetivo que continua sendo notificado, “destaca a importância de intervenções protetoras para este grupo, como a prioridade vacinal”, disse ao Medscape a pesquisadora do estudo, a médica Dra. Katlyn Nemani, professora assistente de pesquisa do Departamento de Psiquiatria da New York University (NYU) Grossman School of Medicine, nos Estados Unidos.

O estudo foi publicado on-line em 22 de setembro no periódico JAMA Psychiatry.

O triplo de mortes

Pesquisas anteriores relacionaram o diagnóstico de transtorno do espectro da esquizofrenia, que abrange a esquizofrenia e o transtorno esquizoafetivo, a quase o triplo do número de mortes entre pacientes com covid-19.

Algumas pesquisas populacionais também descreveram uma relação entre o uso de antipsicóticos e o aumento do risco de morte relacionada com a covid-19, mas esses estudos não levaram em conta os diagnósticos psiquiátricos.

“Isso levantou a dúvida de se o aumento do risco observado nesta população estaria relacionado com a doença psiquiátrica ou com o tratamento", disse o Dr. Katlyn.

O estudo de coorte retrospectivo foi feito com 464 adultos (média de idade de 53 anos) com transtorno do espectro da esquizofrenia ou transtorno bipolar que receberam diagnóstico de covid-19 entre 03 de março de 2020 e 17 de fevereiro de 2021. Destes, 42,2% eram tratados com antipsicóticos.

O desfecho primário foi a evolução para óbito em 60 dias após o diagnóstico da covid-19. As covariáveis foram: caraterísticas sociodemográficas como raça e etnia, idade e tipo de seguro de saúde, diagnóstico psiquiátrico, doenças concomitantes e tabagismo.

Do total, 41 pacientes (8,8%) morreram. A prevalência de morte em 60 dias foi de 13,7% entre os pacientes com transtorno do espectro da esquizofrenia (N = 182) e 5,7% entre os pacientes com transtorno bipolar (N = 282).

O tratamento antipsicótico não foi significativamente associado a mortalidade (razão de chances ou odds ratio, OR, de 1,00; intervalo de confiança, IC, de 95% de 0,48 a 2,08; P = 0,99).

“Isso sugere que os antipsicóticos provavelmente não são responsáveis pelo aumento do risco que observamos nesta população, embora este achado precise ser replicado”, disse a Dra. Katlyn.

Descoberta surpreendente

O diagnóstico de transtorno do espectro da esquizofrenia foi associado ao triplo do risco de morte em comparação com o de transtorno bipolar (OR de 2,88; IC 95% de 1,36 a 6,11; P = 0,006).

“Esta descoberta foi surpreendente”, disse Dra. Katlyn. “Uma explicação possível é a existência de diferenças na função imunitária associadas à doença do espectro da esquizofrenia.”

A médica observou que há evidências sugerindo que o sistema imunitário possa desempenhar algum papel na patogênese da esquizofrenia, e pesquisas mostram que a pneumonia e os quadros infecciosos estão entre as principais causas de morte prematura nessa população.

Além disso, vários potenciais fatores de risco acometem desproporcionalmente as pessoas com doença mental grave, como a maior prevalência de doenças concomitantes, como doença cardiovascular e diabetes, as desvantagens socioeconômicas e as barreiras ao acesso ao tratamento quando necessário. Estudos anteriores também descobriram que pessoas com doença psiquiátrica grave têm menos probabilidade de receber tratamento preventivo, inclusive imunizantes, disse a Dra. Katlyn.

Entretanto, é improvável que esses fatores representem plenamente o aumento do risco encontrado no estudo, disse a psiquiatra. “Nossa população de estudo se limitou às pessoas que foram atendidas no NYU Langone Health System. Fizemos uma lista abrangente de fatores de risco sociodemográficos e clínicos, e nossa pesquisa foi realizada antes de existirem vacinas anticovídicas", disse a pesquisadora.

É necessário que sejam feitas novas pesquisas para compreender o que fundamenta o aumento da suscetibilidade às infecções graves nos pacientes com esquizofrenia e para identificar intervenções que possam controlar este risco, disse a Dra. Katlyn.

“Isso abrange a avaliação de fatores ao nível dos sistemas, como o acesso à prevenção, intervenções e tratamentos, bem como a investigação dos mecanismos imunitários que possam contribuir para a infecção grave e fatal”, disse a especialista.

Os pesquisadores não conseguiram validar diagnósticos psiquiátricos ou capturar as mortes não documentadas no prontuário eletrônico. Além disso, o pequeno tamanho da amostra impediu a análise do uso de antipsicóticos específicos, que podem diferir em seus efeitos associados.

“É possível que antipsicóticos específicos possam estar associados a efeitos prejudiciais ou protetores”, disse a Dra. Katlyn.

Os autores informaram não ter conflitos de interesses relevantes.

JAMA Psychiatry. Publicado em 22 de setembro de 2021. Texto completo

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