ESMO: Muitos pacientes com câncer podem ser tratados apesar da pandemia

Nem todos são altamente vulneráveis à covid-19

Roxanne Nelson

Notificação

7 de agosto de 2020

Nota da editora: Veja as últimas notícias e orientações sobre a covid-19 em nosso Centro de Informações sobre o novo coronavírus SARS-CoV-2.

Na era da covid-19, o tratamento contra o câncer não deveria ser interrompido ou atrasado se isso puder afetar a sobrevida global, de acordo com novas recomendações de uma equipe internacional de especialistas.

Outra recomendação importante é para que deixem de rotular todos os pacientes com câncer como sendo extremamente vulneráveis à infecção pelo vírus, pois isso pode levar a tratamentos inadequados, com potenciais desfechos negativos.

"Embora seja razoável adotar medidas mais protetoras para os nossos pacientes diante do surgimento de uma nova doença infecciosa que não havia sido previamente observada em humanos, nós agora precisamos nos afastar da presunção de que todos os pacientes com câncer estão vulneráveis à covid-19", disse o primeiro autor do artigo de consenso Dr. Giuseppe Curigliano, Ph.D., médico do Istituto Europeo di Oncologia (IEO), na Itália, em uma declaração.

"As implicações são importantes, porque para alguns pacientes o tratamento foi adiado ou interrompido nos últimos meses, e eu acredito que o impacto dessa abordagem excessivamente cautelosa será evidente no futuro."

As recomendações foram publicadas pela European Society of Medical Oncology (ESMO) para ajudar a guiar os médicos "na otimização dos caminhos para o tratamento do câncer", assim como para melhorar os resultados durante a pandemia. As recomendações foram publicadas on-line em 31 de julho no periódico Annals of Oncology.

Estudos mostraram que pacientes com câncer têm mais risco de complicações graves e de morte caso sejam infectados pelo SARS-CoV-2 (acrônimo do inglês, Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2). Dados do registro COVID-19 and Cancer Consortium , por exemplo, mostraram que pacientes com neoplasia em progressão e covid-19 tiveram um aumento de cinco vezes no risco de mortalidade em 30 dias quando comparados com pacientes em remissão ou sem evidências de câncer e covid-19.

Mas, embora isso possa ser verdade para alguns pacientes, Dr. Giuseppe e colaboradores enfatizaram que os indivíduos com câncer não são um grupo heterogêneo e que o próprio termo câncer representa uma miríade de doenças diferentes. Os especialistas europeus observaram que as evidências atuais sugerem que muitos pacientes com tumores sólidos não são mais vulneráveis às complicações graves que a população em geral.

Assim, o prognóstico do câncer varia consideravelmente, e rotular todos os pacientes com câncer como sendo "'vulneráveis à covid-19' provavelmente não é razoável, nem informativo", afirmaram os autores.

Drásticas mudanças foram iniciadas no tratamento de todos os tipos de câncer, e embora essas mudanças parecessem razoáveis no auge da pandemia, observaram os autores, elas foram realizadas sem evidências sólidas. Tentativas de definir o risco individualizado para um dado paciente, levando em consideração o subtipo de seu tumor primário, estágio, idade e sexo, têm sido limitadas.

"Com base nas evidências atuais, apenas pacientes idosos, com múltiplas comorbidades e recebendo quimioterapia são vulneráveis à infecção", explicou o Dr. Giuseppe.

No entanto, em uma observação positiva, um estudo de coorte prospectiva recém-publicado avaliou aproximadamente 800 pacientes com câncer – que tinham covid-19 sintomática – no Reino Unido. A análise não encontrou associação entre o risco de óbito e o tratamento com quimioterapia ou imunoterapia, apontou o Dr. David Kerr, médico da University of Oxford, no Reino Unido, em um comentário recente para o Medscape.

Principais recomendações

Um consórcio internacional foi criado pela ESMO, e o painel multidisciplinar foi composto de 64 especialistas e um representante de pacientes com direito a voto. Eles concordaram quanto a 28 afirmações, que se aplicam podem ser usadas para ajudar em muitas áreas de incerteza atuais, técnicas e clínicas, que vão desde decisões diagnósticas até o tratamento.

As principais recomendações são:

  • Pacientes com câncer com maior risco de infecção grave pelo SARS-CoV-2 são caracterizados por apresentarem câncer ativo e progressivo, idade avançada, performance status ruim, comorbidade, serem tabagistas e possivelmente pelo tipo de câncer.

  • A telessaúde e a saúde digital podem ser ferramentas excelentes para alguns tipos de cuidado como triagem na atenção primária e orientação, mas o encontro presencial pode ser mais efetivo para transmitir informações essenciais sobre o câncer e para pacientes com necessidades complexas.

  • Se possível, pacientes com câncer e aqueles considerados de alto risco devem ser testados para infecção por SARS-CoV-2 antes da admissão hospitalar – independentemente dos sintomas ou achados na radiografia de tórax.

  • Pacientes com câncer e infecção por SARS-CoV-2 têm mais risco de eventos tromboembólicos, e recomenda-se a profilaxia com heparina de baixo peso molecular ou novos anticoagulantes orais.

  • O uso de inibidores de checkpoint imunológico não deve ser suspenso ou postergado caso exista benefício de sobrevida significativo, mas o uso deve ser adiado em pacientes positivos para covid-19 até a sua recuperação.

  • O uso de corticoide em altas doses em pacientes com câncer e infecção por SARS-CoV-2 pode aumentar o risco de morte e, se possível, deve ser realizada a troca para outro imunossupressor.

  • A decisão de usar inibidores de tirosina quinase nos eixos PI3K/AKT/mTOR ou RAS/RAF/MEK é complexa, pois eles interferem com as vias críticas envolvidas nas respostas imunológicas inatas ou adaptativas. Interromper ou protelar a terapia depende do risco e benefício, e a magnitude do benefício dos inibidores de tirosina quinase precisa ser considerada.

Os autores concluíram que, "por fim, esse conjunto de recomendações servirá como um repositório dinâmico de conhecimento, que irá ser melhor informado com o acúmulo de dados sobre a biologia do SARS-CoV-2, as características da pandemia de covid-19, os riscos dos pacientes com câncer associados à covid-19 e seus fatores moduladores, e, finalmente, o tratamento otimizado do câncer na presença do vírus.

Não foram informados financiamentos para o estudo atual. Vários autores declararam relações com a indústria, suas declarações constam no artigo.

Ann Oncol. Publicado on-line em 31 de julho de 2020. Texto completo

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