Obstetras se esforçam para manter em dia o conhecimento sobre a covid-19

Katherine Gammon

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6 de agosto de 2020

Nota da editora: Veja as últimas notícias e orientações sobre a covid-19 em nosso Centro de Informações sobre o novo coronavírus SARS-CoV-2.

No início de abril, a Dra. Maura Quinlan, médica, trabalhava no turno da noite na maternidade do Northwestern Medicine Prentice Women's Hospital, nos Estados Unidos. Na época, a política do hospital preconizava que apenas pacientes com sintomas de covid-19 deveriam ser testados para SARS-CoV-2 (acrônimo do inglês, Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2). As mulheres em trabalho de parto usavam máscaras N95, mas apenas enquanto faziam esforço no parto – e os profissionais nem sempre vestiam a proteção adequada a tempo.

Os bebês nasciam e as famílias se alegravam. Mas A Dra. Maura se lembra dessas semanas com certo grau de horror: "Estávamos cuidando de um grupo de pacientes que provavelmente tinha covid-19", disse ela, e elas estavam em trabalho de parto e sem a proteção adequada.

Ela provavelmente está certa. De acordo com um estudo publicado no periódico New England Journal of Medicine, 13,7% das 211 mulheres que deram entrada na maternidade de um hospital de Nova York entre 22 de março e 02 de abril eram assintomáticas, mas estavam infectadas pelo vírus, potencialmente colocando funcionários e médicos em risco.

A Dra. Maura já sabia que ela e seus colegas ginecologistas e obstetras (G. O.) estavam andando em uma corda bamba e, ao ver essa pesquisa, ficou muito desapontada. No meio de uma pandemia, eles estavam correndo para acompanhar a realidade do parto. Mas, apesar dos esforços para proteger tanto os profissionais como os pacientes, alguns aspectos não estavam sendo abordados. Atualmente, toda paciente em trabalho de parto admitida no Northwestern é testada para o novo coronavírus.

Em todo os Estados Unidos, as enfermarias das maternidades têm trabalhado para encontrar um equilíbrio cuidadoso e informado entre vários interesses concorrentes: a segurança de seus profissionais de saúde, a saúde dos pequenos e vulneráveis seres humanos recém-nascidos e a estabilidade de uma mãe que está dando à luz. Cada hospital vem tomado as melhores decisões possíveis baseadas nos dados disponíveis. O resultado é uma variedade de políticas, mas todas elas se concentram em testes rápidos e proteção adequada.

Alterações nas recomendações

Um estudo de caso de mulheres em um hospital da cidade de Nova York durante o auge do surto na cidade constatou que, de sete pacientes com covid-19 confirmada, duas estavam assintomáticas na admissão no serviço de obstetrícia e, essas duas pacientes acabaram precisando de internação não planejada na unidade de terapia intensiva (UTI). O atendimento oferecido às pacientes antes do diagnóstico de covid-19 expôs vários profissionais de saúde – todos eles sem equipamento de proteção individual (EPI) adequado, escreveram os autores do estudo.

"Além disso, cinco das sete mulheres com covid-19 confirmada estavam afebris no rastreio inicial e quatro não relataram tosse", observaram eles. "Em alguns locais, nos quais a disponibilidade da testagem permanece limitada, os sintomas mínimos relatados por algumas dessas pacientes podem não ser suficientes para levar a uma solicitação de teste para SARS-CoV-2."

Com o aumento progressivo de publicações como esta, as sociedades continuam a atualizar suas recomendações. As orientações mais recentes do American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) foram publicadas em 1º de julho. O grupo sugere testar todas as pacientes em trabalho de parto, principalmente em áreas de alta prevalência. Se o número de testes for limitado, recomenda-se priorizar as gestantes com suspeita de covid-19 e as que desenvolvem sintomas durante a internação.

No Northwestern, o hospital solicita que as pacientes fiquem em casa e em quarentena nas semanas que antecedem a data do parto. Em seguida, eles realizam o teste rápido em todas as pacientes admitidas para o parto e buscam ter os resultados disponíveis em poucas horas.

A ala com 30 quartos da maternidade do hospital permanece reservada para pacientes com resultado negativo. Aquelas com resultado positivo são encaminhadas para uma unidade covid-19 de trabalho de parto com seis leitos em outro local do hospital.

"Tivemos a sorte de ter espaço para fazer isso, porque os hospitais menores provavelmente não têm uma unidade separada e não utilizada onde possam acomodar essas mulheres", disse a Dra. Maura.

Na unidade covid-19, as mulheres dão à luz sem uma pessoa de apoio – nenhum parceiro, doula ou membro da família pode participar. Médicos e enfermeiros usam equipamento de proteção individual completo e trabalham apenas nessa ala. E, uma vez que algumas pesquisas mostram que gestantes assintomáticas ou pré-sintomáticas podem desenvolver sintomas rapidamente após o início do trabalho de parto, a Dra. Maura decide sobre a necessidade de intervenção caso a caso.

Atrasar uma indução pode permitir a resolução da infecção ou fazer com que a paciente passe de doença pré-sintomática para a pneumonia franca. Acelerar o trabalho de parto pode gerar sintomas ou permitir que a mãe tenha o parto em segurança e saia do hospital o mais rápido possível.

"Há uma vantagem em ter o bebê agora, se a paciente se sentir bem – mesmo que esteja sozinha – e voltar para casa", disse a Dra. Maura.

O hospital também testa os parceiros das pacientes com covid-19 confirmada. Os com resultado negativo podem levar o recém-nascido para casa e tentar manter distância até que a mãe não esteja mais sintomática.

Os hospitais desenvolveram abordagens diferentes em diferentes partes dos EUA. O sul da Califórnia está enfrentando seu próprio surto, mas no Ronald Reagan UCLA Medical Center, em Los Angeles, ainda não recebeu pacientes suficientes com covid-19 para justificar uma maternidade separada.

Na UCLA, os funcionários coletam swabs das pacientes no momento da admissão – aquelas com teste positivo são acomodadas em quartos específicos. O objetivo é o mesmo em relação às gestantes com covid-19 confirmada e àquelas com progressão do trabalho de parto antes do resultado dos testes, disse a Dra. Rashmi Rao, GO da UCLA: realizar um parto da maneira mais segura possível para a mãe e o bebê.

Todas as mulheres, com teste positivo ou negativo, precisam usar máscara durante o trabalho de parto – o máximo que puderem tolerar. Em caso de pacientes com sintomas leves ou assintomáticas, a única diferença é que todos usam o equipamento de proteção individual. Mas, se a saturação de oxigênio da paciente cair ou o bebê estiver em sofrimento, a equipe se moverá mais rapidamente para um parto cesáreo do que com uma paciente saudável.

Assim como as políticas hospitalares estão evoluindo, as regras para visitantes também mudam constantemente. Inicialmente, a UCLA permitia que uma pessoa de suporte estivesse presente durante o parto, mas teria que sair imediatamente após. Agora, cada nova mãe pode receber um visitante durante toda a estada. E o hospital sugere que as pacientes com covid-19 confirmada se recuperem em um quarto separado de seus recém-nascidos e as incentiva a manter a distância, exceto durante o aleitamento.

"Respeitamos e entendemos que esta é uma ocasião feliz e estamos tentando manter as famílias unidas o máximo possível", disse a Dra. Rashmi.

Dilemas no atendimento

A forma como os hospitais protegem os recém-nascidos também continua mudando. Circularam relatos de que recém-nascidos foram retirados de mães com covid-19 confirmada, especialmente em comunidades mais vulneráveis. As histórias levaram muitas mães a se preocupar se seriam separadas à força de seus filhos. A maioria dos hospitais, no entanto, deixa a cargo da paciente e dos médicos decidirem quanto de separação é necessária. "Após o parto, depende de como a paciente está se sentindo", disse a Dra. Rashmi.

A American Academy of Pediatrics recomenda que as mães com covid-19 confirmada ordenhem o leite materno e que um cuidador saudável use esse leite, ou fórmula, para alimentar o bebê com mamadeira, e a mãe deve permanecer a um metro e meio de distância da criança, o maior tempo possível. Se não for possível, ela deve usar luvas e máscara durante o aleitamento até ficar naturalmente afebril por 72 horas e pelo menos uma semana após o surgimento dos primeiros sintomas.

"É tragicamente difícil", disse a Dra. Maura, da Northwestern, manter uma mãe com covid-19 confirmada a um metro e meio de distância de seu recém-nascido. "Se a mãe recusar a separação, pedimos à equipe responsável da pediatria que discuta os possíveis riscos e a escassez de dados."

Até recentemente, as pesquisas indicavam que o SARS-CoV-2 não era transmitido para os bebês intrauterinamente. E, apesar de um estudo de caso recente ter relatado transmissão transplacentária da mãe para o feto na França, os pesquisadores ainda dizem que o risco de transmissão é baixo. Para garantir que o risco do recém-nascido permaneça o menor possível, a política da UCLA é coletar o swab do recém-nascido com 24 horas e monitorar os sinais de infecção: letargia progressiva, dificuldade de acordar ou sintomas gastrointestinais, como vômitos.

A transmissão via leite materno também se mostrou relativamente improvável, até o momento. Um estudo publicado no periódico The Lancet detectou o novo coronavírus no leite materno, embora não esteja claro se o vírus pode ser transmitido pelo fluido, afirmou a Dra. Christina Chambers, Ph.D., professora de pediatria na UC San Diego School of Medicine. A Dra. Christina está estudando o leite materno para verificar a presença do vírus ou dos respectivos anticorpos. Ela também está pesquisando como a infecção pelo SARS-CoV-2 afeta as mulheres em diferentes momentos da gestação, algo que ainda está em aberto.

"Nas gestantes infectadas e com deterioração do quadro clínico, as decisões são as mesmas de qualquer parto: salvar a mãe e salvar o bebê", disse a Dra. Christina. "Além disso, me sinto encorajada ao ver que as gestantes são priorizadas na testagem", disse ela, algo que ajudará os pesquisadores a entender a prevalência da doença para entender melhor se alguns sintomas representam maior risco que outros.

A situação está evoluindo tão rapidamente que hospitais e profissionais de saúde estão simplesmente tentando se manter atualizados com o grande fluxo de novas pesquisas. Na ausência de respostas definitivas, estão usando as informações disponíveis e ajustando as condutas em tempo real. "Estamos esperando cautelosamente por mais dados", disse a Dra. Rashmi. "Com as informações que temos, estamos fazendo o melhor possível para manter nossos pacientes em segurança. E continuaremos mantendo essa postura."

Katharine Gammon é escritora freelancer de ciência residente em Santa Monica. Ela tem matérias publicadas no The New York Times, The Atlantic e The Guardian, e pode ser encontrada no Twitter como @kategammon.

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