Na mesa-redonda "Telemedicina e cardiologia", realizada no 36º Congresso de Cardiologia da Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de Janeiro (Socerj 2019), realizado em maio, a Dra. Simone Farah, cardiologista do Hospital Central Aristarcho Pessoa, no Rio de Janeiro, apresentou os resultados da pesquisa [1] que lhe rendeu o título de mestre em telemedicina e saúde pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em 2018.
Em um estudo retrospectivo, a Dra. Simone investigou aspectos da supervisão a distância fornecida a médicos de Unidades de Pronto Atendimento (UPA) 24 horas da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES/RJ) em casos de dor torácica (5.816 pacientes) por cardiologistas do Núcleo de Consultoria Cardiológica (NCC) da SES/RJ, entre janeiro de 2012 e dezembro de 2013.
Os resultados mostraram > 27% de discordância diagnóstica (em 1.593 atendimentos) após consulta remota com o cardiologista supervisor, que avaliou o diagnóstico inicial, feito pelo médico generalista. Para a pesquisadora, a supervisão via telemedicina oferecida aos profissionais da atenção primária nas UPA repercutiu na conduta em relação a procedimentos imediatos e quantidade de internações, reduziu e otimizou a ocupação de leitos terciários, teve impacto na morbimortalidade e na redução de custos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), "telemedicina é a oferta de serviços ligados aos cuidados com a saúde nos casos em que a distância é um fator crítico e usa tecnologias de informação e de comunicação para a troca de informações para diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças e educação continuada de prestadores de serviço em saúde". [2]
Em sua apresentação, a Dra. Simone lembrou que, em 1905, na Holanda, o eletrocardiógrafo foi conectado a uma linha telefônica entre o laboratório do fisiologista Willem Einthoven e os leitos do hospital.
"No Brasil, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), de forma pioneira, emitiu laudos médicos para Goiânia, para dar suporte aos médicos que lidaram com as vítimas do acidente radiológico com Césio 137, ocorrido em 1987. Em 2006, o Governo Federal criou o Programa Nacional de Telessaúde e, em 2011, o Programa Nacional Telessaúde Brasil Redes", [3] disse a médica.
Sobre a justificativa para o uso da telemedicina para doenças cardiovasculares, a pesquisadora afirmou que "se busca impacto na qualidade do atendimento, na diminuição da morbimortalidade e na redução dos custos, já que no Brasil, em 2018, a doença coronariana foi responsável por mais de 242.000 internações no Sistema Único de Saúde (SUS), sendo 7% por infarto agudo do miocárdio (IAM), com custos médicos e socioeconômicos muito elevados". E acrescentou: "nos Estados Unidos, a projeção de gasto com doenças cardiovasculares para 2020 é de aproximadamente 220 bilhões de dólares". [4]
Segundo a médica, no Rio de Janeiro, em 2012, mais de 29% das mortes foram por causa cardiovascular. Dos 9.692 pacientes avaliados pelos cardiologistas do NCC entre os pacientes admitidos nas UPA de janeiro daquele ano a dezembro de 2013, 5.816 (60%) procuraram unidades secundárias com dor torácica. Destes, houve discordância diagnóstica entre o médico da atenção primária e o cardiologista do NCC em 1.593 (27,39%) casos, e neste grupo as diferenças foram muito significativas. A assistência remota dos especialistas possibilitou a correção dos diagnósticos e das estratégias terapêuticas.
Os dados coletados pela Dra. Simone mostraram que os diagnósticos feitos pelos médicos das UPA foram: IAM sem supradesnível do segmento ST em 1.477 pacientes; IAM com supradesnível do segmento ST em 74 pacientes; edema agudo de pulmão em 40 pacientes; e taquiarritmia em 2 pacientes.
"Entretanto, após a avaliação, os cardiologistas modificaram os diagnósticos para: IAM sem supradesnível em 89 pacientes; com supra em 174; angina instável em 385; taquiarritmia em 20; edema agudo em 212; emergência hipertensiva em 152; insuficiência renal crônica agudizada em 113; pneumonia em 89; sepse em 39; miopericardite em 26; e doença orovalvar em cinco pacientes, o que acarretou mudanças terapêuticas imediatas", afirmou.
Os principais equívocos cometidos pelos médicos das UPA foram: má interpretação do eletrocardiograma; não identificação de supra de ST; avaliação equivocada das alterações das enzimas CPK, CPK-MB e troponina; elevação de CPK e CPK-MB sem elevação de troponina; e elevação de troponina por outras causas cardiológicas e não cardiológicas, sem haver episódio isquêmico miocárdico diagnosticado este grupo no atendimento de entrada como IAM.
Neste cenário, os médicos das UPA solicitaram transferência para internação de 1.477 pacientes, número reduzido para 338 pacientes encaminhados para internação após a interferência dos cardiologistas do NCC. No total, após o tratamento com a causa etiológica do quadro definido junto com os cardiologistas, foram dadas 1.178 altas, ocorreram 62 óbitos e 15 casos desconhecidos.
O trabalho da Dra. Simone também foi publicado este ano no periódico International Journal of Cardiovascular Diseases, [5] da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC).
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Citar este artigo: Telemedicina: Estudo avalia assistência de cardiologistas a médicos de UPA em casos de dor torácica - Medscape - 7 de junho de 2019.
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