Discussão
O paciente tem polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica (PDIC), também denominada de polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica. Dada a natureza crônica dos sintomas, a PDIC pode se apresentar de forma semelhante a outras doenças que causam sinais e sintomas neurológicos difusos, como a esclerose múltipla, a artrite reumatoide e a esclerose lateral amiotrófica.
A PDIC se caracteriza pela neuropatia periférica distal, que se manifesta com sinais e sintomas de fraqueza motora e distúrbios sensoriais. A doença resulta da desmielinização bilateral de vários nervos periféricos distais, sendo praticamente simétrica, embora alguma assimetria dos sinais e sintomas e ao exame clínico costume ser observada.
Muitas vezes considerada semelhante à síndrome de Guillain-Barré, que é uma polineuropatia desmielinizante aguda, a maior diferença é que a polineuropatia desmielinizante inflamatória é uma doença crônica. Outra diferenciação importante entre as duas doenças é que a síndrome de Guillain-Barré causa fraqueza dos músculos respiratórios, tornando essa doença potencialmente fatal, o que não ocorre na PDIC. A síndrome de Guillain-Barré costuma ser precedida de alguma infecção, enquanto a PDIC geralmente não o é. Os pacientes que tenham tido um episódio de síndrome de Guillain-Barré podem evoluir para PDIC e para episódios recorrentes de desmielinização dos nervos periféricos característicos da doença; no entanto, os episódios subsequentes geralmente não são tão graves como a síndrome de Guillain-Barré da apresentação inicial.
A fraqueza e a perda sensorial também ocorrem na esclerose múltipla, o que ajuda a explicar por que a esclerose múltipla é muitas vezes considerada no diagnóstico diferencial da PDIC. As duas doenças se caracterizam por episódios recorrentes de desmielinização do sistema nervoso, com melhora dos sintomas e do exame clínico entre os episódios. Os pacientes com polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica muitas vezes têm hiporreflexia ou arreflexia distal, porque a desmielinização atinge os nervos periféricos. Na esclerose múltipla, os pacientes têm os reflexos preservados ou hiperativos ao exame clínico, porque a desmielinização compromete o cérebro e a medula espinhal. A ausência de déficits visuais e cognitivos ao exame clínico também diferencia a PDIC da esclerose múltipla. Nas duas doenças, as recidivas podem ser tratadas com corticoterapia, no entanto, a esclerose múltipla também é tratada com medicamentos de manutenção entre as crises, como interferons ou imunomoduladores.
Tanto a esclerose lateral amiotrófica quanto a PDIC podem apresentar fraqueza e não comprometem a cognição, embora a esclerose lateral amiotrófica tenha progressão mais rápida, enquanto a PDIC é mais associada a sintomas sensoriais. A esclerose lateral amiotrófica é uma doença degenerativa do neurônio motor, enquanto a PDIC é uma neuropatia desmielinizante que acomete as raízes nervosas sensoriais e motoras. Em geral, as duas ocorrem em pacientes com 40 a 60 anos de idade, com algumas variações. Ambas são mais comuns nos homens do que nas mulheres. Os pacientes com esclerose lateral amiotrófica também costumam ter miofasciculação, sinal que não é observado nos pacientes com PDIC. Outra diferenciação importante é que a PDIC pode ser tratada com medicamentos e a esclerose lateral amiotrófica não.
A artrite reumatoide é uma doença inflamatória que pode manifestar sinais e sintomas de fraqueza e perda sensorial devido ao comprometimento neurológico, no entanto, não é uma doença desmielinizante. Na polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica ocorre desmielinização dos nervos. O padrão desmielinizante visto na eletromiografia (EMG) e nos exames de condução nervosa corroboram o diagnóstico de PDIC (Figura 1). [1]
Figura 1.
Os achados eletrofisiológicos típicos na PDIC são a redução da velocidade de condução motora, que reflete a redução da velocidade de condução do nervo motor e o prolongamento do tempo de latência motora distal, o que reflete a desmielinização. Ocorrem também vários bloqueios de condução motora quando a desmielinização impede a transmissão em áreas ao longo das fibras nervosas.
Outros exames utilizados para o diagnóstico da PDIC são: exames de sangue, punção lombar, ressonância magnética da medula espinhal e biópsia de nervo. O exame de sangue pode revelar aumento das células inflamatórias, embora isso possa não acontecer; este aumento de células inflamatórias pode ser visto em muitas outras doenças inflamatórias ou infecciosas. A punção lombar pode revelar aumento dos níveis de proteínas no liquor, que também é considerado um achado inespecífico. A ressonância magnética (RM) da coluna vertebral, especialmente da medula lombar, pode revelar espessamento das raízes nervosas, embora este possa não ocorrer e pode não ser visto em todos os pacientes com PDIC. [2] A biópsia do nervo mostra aparência inflamatória, degeneração axonal e formação de bulbos de cebola (Figura 2).
Figura 2.
A formação de bulbos de cebola descreve um padrão de camadas concêntricas de mielinização em torno de um axônio. Isso ocorre como resultado da desmielinização e remielinização recorrentes. No entanto, alguns desses achados pela biópsia podem não estar presentes em todos os pacientes com PDIC e não constituem o diagnóstico definitivo da doença.
A PDIC é tratada com medicamentos administrados durante as crises destinados a diminuir a inflamação. Os mais comuns são: corticoides por via intravenosa (IV), corticoides orais, imunoglobulina intravenosa (IVIG, do inglês Intravenous Immunoglobulin) e plasmaférese. [3] A maioria dos pacientes responde bem a corticoides, IVIG ou plasmaférese. Outros tratamentos são os imunossupressores e os quimioterápicos. Os quimioterápicos e os imunossupressores geralmente são usados para pacientes que não responderam ao tratamento habitual, e costumam estar associados a mais efeitos colaterais graves, como alopecia, anemia e, naturalmente, comprometimento imunitário. Os dados relativos ao grau de eficácia desses medicamentos para a polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica ainda estão emergindo.
Os pacientes com PDIC geralmente apresentam recorrência dos sintomas meses ou anos após sua resolução. Essas recorrências são parte do próprio processo da doença, e não o resultado de um tratamento incompleto. Os pacientes precisam ser tratados quando ocorrem recidivas. Os pacientes com PDIC geralmente não recebem tratamento para a doença entre as crises. Além do tratamento médico, a fisioterapia e a terapia ocupacional também são recomendadas, já que os sinais e sintomas de fraqueza nem sempre resolvem completamente.
Neste caso, o paciente foi tratado com corticoides IV e durante um dia continuou a apresentar diminuição da força motora, bem como urgência urinária, mas não teve fraqueza dos músculos respiratórios. Após 24 horas, o paciente começou a melhorar e observou melhora importante da força motora em alguns dias; no entanto, continuou com fraqueza residual em comparação com o início do quadro durante cerca de seis semanas após essa crise.
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Citar este artigo: Homem de 57 anos com dificuldade de deambular sem explicação - Medscape - 22 de fevereiro de 2019.
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