Jovens não-binários e homens transgêneros têm maior risco de tentar suicídio durante a adolescência

George W. Citroner

Notificação

5 de outubro de 2018

Segundo um novo estudo, o índice de tentativas de suicídio entre adolescentes homens transsexuais é significativemente maior do que em outros grupos transgêneros ou entre adolescentes cisgêneros, cuja identidade de gênero corresponde com o sexo ao nascimento.

De acordo com dados dos Centers for Disease Control and Prevention (CDC), o suicídio é a segunda causa de morte entre a população jovem de 15 a 19 anos no Estados Unidos.

"Descobrimos que os jovens transgêneros – aqueles cuja identidade de gênero não corresponde ao sexo atribuído no nascimento – tinham maior probabilidade de relatar tentativa de suicídio quando comparados com jovens cisgêneros – pessoas cuja identidade de gênero corresponde ao sexo atribuído no nascimento", disse Russell B. Toomey, da University of Arizona, Tucson, ao Medscape.

"De todos os grupos, os jovens transgêneros que se identificaram como homens ou como não-binários, relataram os maiores índices de tentativas de suicídio. Nós também observamos que a orientação não-heterossexual foi associada com maior risco de tentativas de suicídio entre todos os jovens, exceto os que se identificaram como não binários".

O estudo foi publicado on-line em 11 de setembro no periódico Pediatrics.

Primeiro estudo que avaliou as diferenças em cada grupo

Esse não é o primeiro estudo sobre suicídio entre adolescentes com disforia de gênero. Uma pesquisa publicada em agosto de 2016, na Suicide and Life-Threatening Behavior, o periódico oficial da American Association of Suicidology, também mostrou maiores taxas de suicídio e de automutilação em adolescentes transgêneros.

No estudo publicado em 2016, os pesquisadores analisaram dados de prontuários de 96 pacientes transgêneros (de 12 a 22 anos) com disforia de gênero que passaram pela Transgender Health Clinic no Cincinnati Children's Hospital.

Além do maior risco de suicídio, os resultados mostraram que 58% dos participantes receberam pelo menos um diagnóstico psiquiátrico adicional ao de disforia de gênero.

"As pesquisas anteriores foram capazes de mostrar que os jovens transgêneros têm maior risco de suicídio, a nossa é a primeira a avaliar a possibilidade de existirem diferenças entre os grupos de jovens transgêneros", disse Toomey.

A equipe de pesquisadores analisou dados de 2012 a 2015, retirados da  pesquisa Profiles of Student Life: Attitudes and Behaviors , que reuniu informações de 120.617 pessoas de 11 a 19 anos.

Dentre os participantes, 60.973 se identificaram como mulher e 57.871 como homem. Menos de 1% dos adolescentes pesquisados se identificaram como transgênero.

Entre os que se identificaram como transgênero, 1.052 adolescentes se identificaram como em dúvida, 344 como transgênero não-binário, 202 como mulher trans (transição de homem para mulher) e 175 como homem trans (transição de mulher para homem).

Cerca de 14% de todos os participantes disseram ter tentado suicídio.

Homens trans adolescentes sob maior risco

Os pesquisadores descobriram que 50,8% dos homens trans adolescentes – pessoas que nasceram mulheres, mas se identificam como homens – tentaram se matar.

Além disso, 42% dos adolescentes que se identificaram como não-binários, definido como, pessoas que não se identificam exclusivamente com nenhum dos dois gêneros, relataram tentativa de suicídio – relato feito também por 30% das mulheres trans adolescentes.

Para comparação, apenas 18% das mulheres e 10% dos homens cujas identidades de gênero condiziam com o sexo ao nascimento tentaram suicídio.

Toomey explicou que, "devido ao tamanho de nossa amostra, fomos capazes de avaliar se essas diferenças existiam ou não. Uma compreensão sobre essas diferenças é fundamental para os esforços de prevenção de suicídio e outras intervenções, particularmente as voltadas para jovens transgêneros".

Ele disse ainda que podem existir duas razões para essas diferenças existirem.

"A primeira é que pode ser que já tenhamos perdido mulheres trans adolescentes por suicídio. Não conseguimos capturar isso nos dados e, nos Estados Unidos, não temos uma coleta sistematizada da identidade de gênero nos registros de óbito", disse.

"A segunda é que os jovens que se identificam como homens trans ou não-binários simplesmente não encontram uma comunidade ou visibilidade".

Toomey enfatizou que uma das descobertas-chave para todas as populações é que um forte preditor de suicídio é a ausência do sentimento de pertencimento, ou sentir-se desconectado dos outros.

"Dado que grande parte da atenção da mídia concentra-se nas experiências de mulheres trans jovens, os jovens que se identificam como homens trans ou não-binários podem não se ver representados ou sentir que não pertencem à comunidade", disse Toomey.

"Invalidação e marginalização"

Em comentário para o Medscape, o Dr. John B. Steever, professor-assistente de pediatria, Icahn School of Medicine at Mount Sinai, Nova York, disse que os jovens transgêneros também têm maior probabilidade de serem diagnosticados com transtorno alimentar, de apresentar comportamento de automutilação não suicida – como se cortar – e de abuso de substâncias, em comparação com seus pares cisgênero.

"Isso geralmente ocorre como resposta a uma vida inteira de invalidação e marginalização", disse Dr. Steever, que não fez parte da equipe do estudo.

Ele também citou que a terapia hormonal pode ter um papel importante na redução do risco de suicídio.

"Apesar de não ter sido formalmente estudado, iniciar o tratamento hormonal compatível com a identidade de gênero em adolescentes transgêneros pode reduzir o risco de suicídio, porque sabemos que a saúde mental melhora significativamente quando o tratamento hormonal começa", disse.

Dr. Steever enfatizou que para a maioria dos jovens transgêneros, os altos índices de problemas de saúde mental surgem da "marginalização da sociedade e da violência contra as pessoas trans ou não-binárias, e não do fato de serem transgêneros".

"Quando a família de uma pessoa trans jovem a aceita e a apoia, a saúde mental dela é muito melhor do que quando a família a rejeita", completou.

Contudo, Toomey não tem tanta certeza sobre isso. "Empiricamente, sabemos muito pouco sobre os fatores que podem reduzir as chances de comportamento suicida entre jovens transgêneros. Este estudo, em especial, não avaliou como a família, a escola, e os grupos da comunidade deveriam ou poderiam tratar as pessoas que se identificam como transgênero".

Em geral, "esses resultados apenas indicam que devemos fazer mais para a prevenção de suicídios entre jovens transgêneros e ter certeza de que vamos fazer frente ao risco particularmente alto entre adolescentes homens trans e não-binários", concluiu.

Os autores declararam não possuir nenhum conflito de interesses relevante.

Pediatrics. Publicado on-line em 11 de setembro de 2018. Resumo

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