São Paulo monitora expansão da febre amarela e aguarda chegada do vírus no litoral do estado

Ruth Helena Bellinghini

Notificação

12 de março de 2018

A tarefa de mapear a expansão do vírus da febre amarela no Estado de São Paulo cabe ao veterinário Adriano Pinter, pesquisador da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen). Pinter trabalha com um modelo descritivo, que registra com precisão local e data de cada epizootia (morte de macacos) registrada no Estado, e o tempo decorrido entre uma morte e outra. São esses dados que servem de base para determinar as prioridades de vacinação nas campanhas da Secretaria de Estado da Saúde. Foi assim, por exemplo, que ele determinou que o vírus se expande do Norte para o Sul do Estado a uma velocidade de 2,5 km por dia, e conseguiu prever a chegada do vírus à região de Campinas e, mais recentemente, ao Vale do Paraíba, onde já alcançou as cidades de São José dos Campos e Jacareí. Hoje, a mira do pesquisador está na chegada do vírus ao litoral paulista, com três possíveis rotas de entrada.

"Ainda não temos uma data porque não temos registro de epizootias, mas é certo que o vírus vai chegar ao litoral pela Serra do Mar. E parece que ele veio para ficar", afirma. Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, o litoral paulista é a região com a menor taxa de adesão à campanha de vacinação.

Imagem: cortesia da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo

No mapa acima, as linhas vermelhas mostram o caminho de entrada do vírus na capital do estado, mapeado pelas mortes de macacos. As linhas laranja mostram o caminho previsto de extensão da febre amarela, em direção ao litoral sul paulista.

A presença do vírus da febre amarela não é novidade no Estado, tanto que as cidades de Ribeirão Preto e São José do Rio Preto eram áreas de vacinação desde 2001, e em ambas a imunização é rotina. Em 2009, já se sabia da chegada do vírus a Sorocaba, Botucatu e Avaré, onde houve registro de mortes de macacos por febre amarela. Da mesma forma, foi traçada a rota de chegada do vírus à capital paulista.

"A entrada foi através de Poços de Caldas, seguindo para São João da Boa Vista, no ano passado, Monte Alegre do Sul, Amparo, Vinhedo, Louveira, Campinas e Jundiaí", enumera.

De acordo com Pinter, é importante destacar que a área mais central da cidade não apresenta condições para disseminação da febre amarela silvestre, mas ela pode se tornar um problema nos bairros em contato com áreas de mata, como é o caso da zona Norte (nas proximidades da Cantareira), ou em regiões rurais da capital, como Engenheiro Marsilac, no extremo sul da cidade, e bairros como Parelheiros e Grajaú. Por isso essas áreas e bairros próximos entraram na rota da vacinação preventiva, assim como Itapecerica da Serra e as cidades do ABC (Santo André, São Bernardo e São Caetano) que ficam próximas a áreas de mata.

"É difícil pensar na cidade de São Paulo como tendo uma área rural, mas é bom lembrar que Engenheiro Marsilac é nascente de um rio, o Rio Branco, que deságua em Itanhaém, no Litoral. É bem possível que o caso autóctone de febre amarela registrado dia 17 de fevereiro, na zona de mata em Itanhaém, tenha vírus que seguiram esse corredor de floresta para o litoral, embora não haja registro de epizootia naquela cidade", explica o pesquisador. Por conta desse caso, todos os parques estaduais da Serra do Mar foram alertados para registrar possíveis epizootias.

"Foi feito treinamento com guardas-parque e monitores até a região de Cananéia e Registro, para que mortes de macacos sejam notificadas e, se possível, amostras sejam coletadas e enviadas para análise no Instituto Adolfo Lutz. A cidade de Registro entrou na campanha de vacinação porque houve registro de epizootia na área", acrescenta.

Outra possível rota de chegada do vírus ao litoral paulista é Cubatão, a partir de São Bernardo do Campo. A área do Vale do Paraíba e a divisa com o Rio de Janeiro são outra fonte de preocupação para as autoridades de saúde do Estado.

"Estamos acompanhando os casos de Valença e Angra dos Reis, já que houve nove pacientes mortos na Ilha Grande. Se a febre amarela chegar a Parati, temos um grande risco de o vírus chegar ao litoral norte a partir de Ubatuba", alerta o especialista.

Mudança no vírus

Os pesquisadores ainda não sabem ao certo se o Estado vai enfrentar alguns poucos casos constantemente, de forma endêmica, ou se vai embora e volta em um novo ciclo, causando novos surtos de oito em oito anos, por exemplo. Mas há diferenças entre o surto que atinge São Paulo e os anteriores.

"Historicamente, o vírus chegou ao Estado, mas não se estabeleceu por aqui porque dizimava toda população de macacos e acabava desaparecendo. Esta é uma característica da febre amarela no Sudeste, onde costumava aparecer de forma rápida, pontual e desaparecia – ou seja, na forma epidêmica", explica Pinter, acrescentando que nunca antes o vírus havia alcançado a Mata Atlântica e a Serra do Mar.

Anteriormente, informa o veterinário, o vírus da febre amarela já alcançou Minas Gerais, as regiões de Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, mas a expansão era contida.

"Alguma coisa aconteceu nos últimos anos que mudou o comportamento do vírus", diz o pesquisador. De acordo com ele, a hipótese mais aceita é de que os últimos invernos foram mais quentes, tanto que no ano passado o vírus circulou no inverno, o que não acontecia antes. A outra hipótese é a de que programas de reflorestamento no Estado teriam aumentando os corredores florestais, facilitando o deslocamento e macacos.

"No entanto, essa avaliação de que a área de mata passou de 12% para 16% por causa do reflorestamento pode não ser verdadeira, já que houve uma mudança de metodologia", observa. De acordo com Pinter, a verificação passou a ser feita por satélite, e é possível que o sistema tenha localizado áreas de mata que não eram contabilizadas anteriormente.

"Além disso, há 30, 50, 60 anos havia muito mais cobertura florestal no Estado e nem assim o vírus chegava e se estabelecia por aqui", pondera, acrescentando que o Estado terá de vacinar toda a população e incluir a vacina contra a febre amarela no calendário infantil de imunizações.

O Ministério da Saúde já considera a possibilidade de recomendar a vacinação em todo território nacional daqui em diante.

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