COMENTÁRIO

Clube de Revista: os destaques do San Antonio Breast Cancer Symposium de 2017

Dr. Bruno Lemos Ferrari

Notificação

10 de janeiro de 2018

Colaboração Editorial

Medscape &

Neste artigo

2. Enzalutamida mostra resultados promissores no câncer de mama que expressa receptores androgênicos

A enzalutamida é um anti-androgênio de última geração amplamente utilizado no tratamento do câncer de próstata resistente a castração. Seu mecanismo de ação consiste em impedir o acoplamento dos andrógenos a seus receptores, bem como a translocação do complexo andrógeno/receptor até núcleo, e sua interação com o DNA celular.

A aplicação em neoplasias de mama, até então, é pouco conhecida. Entretanto, sabe-se que a expressão de receptores de androgênio (RA) é relativamente alta no câncer de mama receptor hormonal positivo (RH+), e que sua presença está relacionada à resistência a hormonioterapias tradicionais (tamoxifeno, inibidores de aromatase).

Com o objetivo de investigar a influência do uso de enzalutamida na população RH+, especialmente na doença com receptor androgênico positivo, a Dra. Denise Yardley apresentou os resultados de um interessante trabalho abordando esse tema.

O estudo de fase II recrutou 247 mulheres na pós-menopausa com diagnóstico de câncer de mama RH+ metastático ou localmente avançado. Elas foram divididas em duas coortes: na primeira, foram arroladas 127 pacientes virgens de terapia hormonal. Já a segunda era composta por 120 mulheres que já haviam recebido uma linha prévia de endocrinoterapia.

Nas duas coortes, as participantes foram randomizadas 1:1 para receber examestane (50 mg/dia) + enzalutamida (160 mg/dia), ou examestane (25 mg/dia) + placebo. A enzalutamida é um potente inibidor da CYP3A4, e reduz a biodisponibilidade de examestane pela metade. Em virtude disso, a dose do inibidor de aromatase utilizada no grupo experimental foi dobrada.

O estudo tinha como objetivo primário a avaliação da sobrevida livre de progressão (SLP) tanto na população com intenção de tratar (ITT, do inglês Intent-to-Treat), quanto no subgrupo de pacientes que tinham uma assinatura genética positiva para expressão de receptores androgênicos. Aproximadamente 40% das pacientes da coorte 1 e 29% das pacientes da coorte 2 apresentavam positividade RA. Considerando o racional do mecanismo de ação da droga, esse grupo representa as melhores candidatas a possíveis benefícios da enzalutamida.

Na análise da população global (ITT), a adição de enzalutamida realmente não trouxe benefícios em sobrevida livre de progressão. Mas o que realmente intrigou em meio aos resultados apresentados foi a significativa diferença de SLP observada quando as coortes foram estratificadas com base na expressão de receptor hormonal androgênico (RA) e na linha de tratamento.

As mulheres virgens de manipulação endócrina (coorte 1) e que expressavam biomarcador androgênico foram as maiores beneficiadas. Tiveram uma SLP de 16,5 meses contra 4,3 meses daquelas que não expressavam receptores androgênicos (HR de 0,44; P = 0,035). Essa vantagem, contudo, não se sustentou na coorte 2, representada pelas participantes já expostas a uma linha hormonal prévia, mesmo sendo RA+. Nesse grupo, as sobrevidas foram de 6,0 e 5,3 meses nos braços de enzalutamida e placebo, respectivamente (HR de 0,55; P = 0,1936). Os motivos que justificam essa diferença não ficaram claros.

O perfil de efeitos colaterais da associação foi compatível com o que já havia sido observado em estudos anteriores. Dentre os principais sintomas reportados destacam-se: náusea (39%) e fadiga (37%). Na coorte 1 e 2, respectivamente, 14,5% e 18,3% das usuárias de enzalutamida descontinuaram o tratamento em decorrência de eventos adversos, ao passo que no grupo placebo os números foram: 15,9% e 8,3%.

Para lembrar:
O uso de enzalutamida no tratamento do câncer de mama RH+, sob uma óptica mais superficial, parece ser um contrassenso. Dai vem a importância desse estudo, que conseguiu identificar um subgrupo de mulheres potencialmente respondedoras à associação de um anti-androgênio ao bloqueio hormonal. Esses achados são geradores de hipótese, e tornam imprescindível a condução de estudos de fase III com potencial para mudar a prática clínica da oncologia atual.

Referência:
Krop I, Abramson V, Colleoni M, et al. Results from a randomized placebo-controlled phase 2 trial evaluating exemestane ± enzalutamide in patients with hormone receptor-positive breast cancer. In: Proceedings from the 2017 San Antonio Breast Cancer Symposium; December 5-9, 2017; San Antonio, Texas. Resumo GS4-07.

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