
A experiência do médico como paciente — Portugal
A experiência singular dos médicos que passam para o outro lado da mesa, o dos pacientes, é o foco deste inquérito on-line feito pelo Medscape com a participação de 386 profissionais de saúde atuantes em Portugal. Debruçado sobre a delicada interação entre o conhecimento de medicina e a experiência pessoal enquanto paciente, o inquérito mostrou, entre outras coisas, que a maior parte dos entrevistados acredita que o cuidado médico prestado a eles é igual ou superior ao oferecido a pacientes não médicos. A maioria também crê que colegas nunca devem cobrar consulta de outro médico. Apesar da confiança no sistema de saúde, as respostas dos médicos portugueses entrevistados revelaram algumas nuances interessantes dessa "mudança de lugar". Por exemplo, o que acontece quando um médico-paciente diverge do colega que indica o tratamento? E como lidar com questões como empatia, prevenção, adesão terapêutica e a própria dinâmica da relação médico-paciente?
Nos slides a seguir, apresentamos alguns dos resultados do inquérito e os relatos dos próprios entrevistados sobre suas experiências enquanto pacientes.
A experiência do médico como paciente — Portugal
De uma maneira geral, a maioria (81%) dos médicos portugueses que já estiveram na condição de pacientes acreditam que o cuidado prestado por seus pares é igual ou superior em qualidade quando comparado ao atendimento dado a pacientes não médicos.
A experiência do médico como paciente — Portugal
Embora a maioria dos participantes tenha dito que não espera ser tratado de forma diferente simplesmente por ser médico, um percentual alto (32%) afirmou ter essa expectativa. "Os médicos, em geral, são maus doentes", brincou uma médica de Coimbra, ao ser solicitada a comentar sobre o tema tratado no inquérito.
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Quando questionados sobre a frequência dessa distinção no atendimento, a maioria (56%) dos médicos que respondeu ter recebido um atendimento melhor apenas por serem profissionais da medicina apontou que isso ocorre com regularidade. Já entre os que tiveram a experiência oposta — um atendimento pior do que o dado a pacientes não médicos — a maioria (64%) afirmou que isso ocorre às vezes ou raramente.
A experiência do médico como paciente — Portugal
A experiência do médico como paciente — Portugal
Mais de um terço dos participantes da pesquisa (36%) já estiveram hospitalizados por doença grave. A maioria (58%) afirmou que, por serem médicos, ficam mais apreensivos com a possibilidade do internamento. Um dos receios mais citados entre os participantes com mais de 60 anos foi o de receber menos orientações e explicações sobre o próprio tratamento por conta da formação em medicina.
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Ainda que a grande maioria dos entrevistados se sintam seguros sendo tratados por colegas, eles sabem de antemão que terão um comportamento diferente dos outros pacientes durante a permanência no hospital. A maioria (72%) afirmou que faria muito mais perguntas aos profissionais da saúde do que os pacientes não médicos.
A experiência do médico como paciente — Portugal
Os participantes do inquérito conhecem os riscos das medicações e mostram confiança nos colegas. Questionados sobre se estariam seguros em tomar medicamentos prescritos por outros profissionais da saúde, 92% responderam que sim. No entanto, uma parcela significativa dos entrevistados (66%) afirmou que faria mais perguntas e questionamentos sobre os medicamentos receitados do que os pacientes não médicos.
A experiência do médico como paciente — Portugal
As respostas aqui parecem refletir uma sensação de vulnerabilidade do médico dentro de um ambiente que, em circunstâncias normais, é de atuação profissional. Conhecer bem todos os riscos dos procedimentos e dos medicamentos administrados foi outro foco de temor apontado por muitos respondentes. Angústia e medo de complicações ou agravamento do quadro também foram temas recorrentes.
"Conhecer os sinais e sintomas não é o mesmo que os sentir", resumiu um ortopedista atuante em Viseu.
A experiência do médico como paciente — Portugal
Aqui as respostas refletem um pouco do que o cinema e a literatura já exploraram sobre a experiência do médico como paciente: é muito difícil sair dela sem refletir sobre as próprias atitudes e condutas no exercício da profissão. A maior parte dos entrevistados apontou que a vivência como paciente ajudou a aumentar a empatia em relação a seus próprios pacientes.
"Como paciente, percebemos a enorme falta de uma explicação, de um sorriso ou de um bom-dia", escreveu uma anestesiologista de Aveiro.
A experiência do médico como paciente — Portugal
Boa parte dos entrevistados (37%) quase sempre dispensa o auxílio de outros profissionais para cuidar de si. Mais da metade (54%) atua como o próprio médico às vezes. No entanto, a maioria (95%) garante que consegue recorrer a um especialista se for necessário.
"Situações simples, eu resolvo. Para situações complexas, ou que não consigo resolver no tempo previsto, ouço a opinião de colegas", escreveu uma médica de família de Lisboa.
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Ao serem questionados sobre preferências no atendimento, 26% responderam que preferem ser tratados por um médico conhecido, principalmente um colega de trabalho. Em segundo lugar, empatadas com 23% das respostas, ficaram as opções "não tenho preferência" e "por um médico que conheço, de preferência um amigo próximo". Mas nem sempre a familiaridade com o local ou com o médico que presta o atendimento resulta em um desfecho positivo, conforme exemplifica o relato de uma cirurgiã de Évora: "Esperava que me informassem claramente sobre o diagnóstico, mas não o fizeram por medo de dar más notícias — o que me fez questionar a capacidade desses médicos. Por ser tratada por um amigo, recebi um diagnóstico oncológico com atraso", escreveu.
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Eis aqui um dos temas mais sensíveis. Uma minoria espera a cortesia naturalmente, enquanto boa parte acha que a cobrança é apropriada às vezes, dependendo das circunstâncias, o que aumenta as chances de uma das partes se sentir desrespeitada ou surpreendida. A parcela mais expressiva é contrária ao pagamento.
A experiência do médico como paciente — Portugal
O total de respostas afirmativas a essa pergunta foi apenas 5% superior às negativas, o que indica ser uma questão controversa. Os relatos dos entrevistados são diversos, bem como as razões para os que respondem "sim". Alguns contaram que pediram uma segunda opinião para obter uma visão mais esclarecida antes de tomar a decisão final de aceitar ou não o tratamento proposto. Outros disseram que recusaram a medicação ou o tratamento pela falta de evidência científica. Entre os que responderam não ter questionado a decisão de seu médico, a justificativa mais comum foi concordar com o racional da tomada de decisão.
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Embora a maior parte das respostas (41%) tenha mostrado que a doença ou diagnóstico não afetou a carreira, as duas alternativas seguintes mais escolhidas mostram que o impacto mais comum foi a necessidade de se afastar do trabalho, seja temporariamente (licença) ou permanentemente (aposentadoria).
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Em resposta à pergunta que invariavelmente gera alguma reflexão sobre a jornada do médico como paciente, a maior parte respondeu que a experiência trouxe mais empatia em relação àqueles que recorrem ao atendimento. Isso aconteceu devido à melhor compreensão dos inconvenientes e das dificuldades do internamento e do período de convalescença, ou pela percepção do impacto de receber um diagnóstico e ter de adaptar a própria rotina ao tratamento necessário. Uma cardiologista de Lisboa contou que agora tem mais paciência para explicar as suas decisões de tratamento e melhorou o diálogo com os doentes e seus familiares mais próximos.
"Respeito muito mais as queixas dolorosas porque senti muitas dores", escreveu uma anestesiologista do Porto.
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