
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Estilo de vida e burnout médico no Brasil - 2020
Este levantamento feito pelo Medscape em português entre 09 de junho e 23 de agosto de 2020 com 2.475 médicos brasileiros mostrou que o burnout é um desafio por vezes maior do que a profissão em si. Um em cada 10 médicos que responderam anonimamente ao questionário on-line enviado por e-mail confessou que pensa em abandonar a medicina por conta dos problemas e dissabores vivenciados na saúde brasileira (pública e privada) – agravados de forma avassaladora com a pandemia de covid-19.
Nem tudo, no entanto, mudou para pior desde o último levantamento sobre o tema, feito em 2018. A amostra participante de 2020 parece estar se cuidando mais e melhor. Veja a seguir os principais resultados da nova pesquisa sobre estilo de vida e burnout médico no Brasil, que este ano vem com uma novidade: um recorte por gerações, dividas em geração Z (menos de 25 anos), Millennials (25 a 39 anos), geração X (40 a 54 anos), baby boomers (55 a 73 anos) e geração silenciosa (mais de 73 anos).
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Millenials têm mais burnout e depressão
Os respondentes entre 25 a 39 anos de idade, os Millennials, são os campeões de burnout e depressão. Em relação ao último levantamento feito pelo Medscape em 2018, a porcentagem de médicos que responderam ter burnout, depressão, ou as duas coisas juntas, diminuiu em 10 pontos percentuais. No grupo que respondeu sofrer de burnout, quase seis em cada 10 (59%) afirmaram que seu burnout ficou mais intenso com a pandemia de covid-19.
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Maioria trabalha muitas horas
Em comparação com o levantamento de 2018, menos participantes da amostra de 2020 afirmaram trabalhar mais de 50 horas por semana. Ainda assim, somadas as porcentagens totais, 53% dos respondentes normalmente trabalham mais de 40 horas por semana.
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Pandemia reduziu horas de consultório
O gráfico acima reflete uma realidade vivida pelos especialistas que não atuam na linha de frente contra a covid-19, visto que a maioria dos respondentes da pesquisa foi formada por especialistas que atuam predominantemente em consultório. Um recorte feito apenas com generalistas ou com profissionais que disseram atuar em hospital, no entanto, refletiu uma realidade diferente: 69% dos generalistas e 58% dos médicos que atuam em hospitais afirmaram que vêm trabalhando o mesmo ou mais do que antes da pandemia.
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Incentivo moral e financeiro
Muito tem se falado sobre o burnout dos profissionais que atuam na linha de frente da pandemia e, apesar de importantes iniciativas, ainda estamos longe de mensurar o impacto desta crise em longo prazo na força de trabalho da saúde. Ao serem indagados sobre suas expectativas em relação ao reconhecimento pelo respectivo engajamento no combate à covid-19, a maioria dos médicos referiu "reconhecimento pelo trabalho" (54%) e a segunda resposta mais prevalente foi retorno financeiro na forma de "bônus no pagamento" (52%).
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Impacto na motivação para atender e na empatia para com os pacientes
Depressão situacional foi a resposta mais comum entre os médicos que se consideraram deprimidos, sendo o trabalho (51%) o principal fator a contribuir para a depressão. Para mais da metade desse grupo (53%) a depressão tem algum impacto na relação com o paciente, sendo menos empatia e menos motivação para atender as duas consequências mais citadas pelos respondentes.
Ao serem perguntados sobre as consequências da depressão no ambiente de trabalho, os principais impactos citados foram chegar atrasado ao trabalho, se irritar mais facilmente e ser menos amigável com os colegas e funcionários.
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Excessos que interferem
Ao menos 1 em cada 10 médicos que responderam à pesquisa pensa em abandonar a medicina para sempre por conta da gravidade do burnout que sofre. Entre os fatores que contribuem para o burnout, os mais citados foram baixa remuneração, excesso de tarefas burocráticas e muitas horas de trabalho por semana.
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Sobrecarga e caminhos de mudança
Melhores salários, mais tempo livre remunerado e mais oportunidades de crescimento foram as opções mais votadas quando os respondentes foram solicitados a pensar sobre como reduzir o burnout no trabalho. Burnout este que acaba interferindo muito nas relações pessoais, de acordo com 79% dos participantes da pesquisa. Uma carga que, muitas vezes, recai de forma mais pesada sobre as médicas.
"Me paralisou a ponto de precisar de 15 dias de afastamento durante a pandemia. Chorava todos os dias ao chegar em casa", conta uma cardiologista.
"Vários colegas não estão trabalhando, e há sobrecarga em quem trabalha. Estou bebendo mais álcool e sem paciência com marido (que não me ajuda) e filhos. Não posso dar atenção à minha mãe que tem 86 anos", desabafa esta radiologista.
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Medo da exposição
Um terço dos entrevistados revelou já ter tido pensamentos suicidas, e 5% informaram que tentaram pôr fim à própria vida. Nesses dois grupos, um total de 47% procurou ajuda de um terapeuta para lidar com o problema. Entre os que não buscaram ajuda, a metade afirmou crer que consegue lidar com o problema sem auxílio de profissional; 22% disseram temer torná-lo público.
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Programas de ajuda: mais oferta, mas menos participação
A porcentagem de participantes que respondeu contar com um programa de combate ao estresse/burnout no trabalho aumentou de 4% em 2018 para 11% em 2020. Por outro lado, a porcentagem de respondentes que disse ter usado esse tipo de recurso oferecido pelo empregador diminuiu de 42% no levantamento de 2018 para 22% na pesquisa deste ano.
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Mudanças na atitude
Se em 2018 dormir foi a atitude mais citada pelos respondentes como opção adotada para combater o burnout, em 2020 a prática de exercícios físicos ficou em primeiro lugar na amostra geral, entre a geração X e os baby boomers – os Millennials preferem dormir para combater o burnout.
Quanto ao consumo de álcool, o percentual de abstêmios aumentou ligeiramente, de 22% em 2018 para 23% em 2020 – as mulheres seguem sendo maioria neste grupo – e 47% dos participantes afirmou consumir até cinco unidades de álcool por semana (uma taça de vinho corresponde a 2,1 unidades).
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Mudanças na clínica
Redução nas horas de trabalho e modificações no modo de trabalhar foram as opções mais adotadas pelos participantes da pesquisa. No recorte por faixa etária, modificação no modo de trabalhar foi a opção mais citada entre a geração X, e redução das horas de trabalho foi a principal escolha entre os Millennials e os baby boomers. Um bom exemplo disso é o que escreveu essa nefrologista:
"Tive diagnóstico de burnout no fim do R4. Foram alguns anos de terapia, mudei de cidade... hoje em dia, coloco minha saúde (física e mental) em primeiro lugar."
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"A vida é mais do que trabalho"
No geral, a percepção de felicidade em relação à vida fora da profissão não mudou muito em comparação com o levantamento feito em 2018, com a mesma porcentagem (10%) de respondentes atuais se dizendo muito infeliz ou extremamente infeliz, e 49% (1% a mais do que em 2018) informando estarem muito felizes ou extremamente felizes. Nós pedimos a este último grupo para contar por que se sentiam assim. Eis algumas respostas:
"Em relação à maioria absoluta das pessoas, faço o que escolhi fazer, e ganho o suficiente para sustentar minha família com o meu trabalho."
"As dificuldades fazem parte do trabalho. Sou uma otimista, e amo o que faço."
"A vida é mais do que trabalho. Ela é contínua, independentemente do trabalho".
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Maioria adora o que faz
Quando o tema é percepção de felicidade em relação à vida profissional, novamente, pouca coisa mudou em comparação com o levantamento de 2018, com um aumento de 34% para 38% entre os participantes que escolheram as respostas muito e extremamente feliz.
O recorte geracional feito na pesquisa deste ano mostrou que a maior porcentagem de respostas nos extremos mais negativos veio dos Millennials (11%), e os baby boomers foram os que mais escolheram os extremos mais positivos (49%), como ilustra esse pequeno depoimento de um cardiologista veterano:
"Tenho 73 anos e só trabalho no consultório. Tive covid-19, fiquei internado por cinco dias, melhorei e fiquei um mês me recuperando. Nesse período ajudei 136 pessoas pelo telefone, e sou muito feliz por ter podido ajudá-las."
Estilo de vida e burnout médico no Brasil 2020
Autocuidado
Ao todo, 44% dos participantes informaram que sempre ou frequentemente dedicam tempo suficiente à própria saúde. Quase 60% disse praticar atividades físicas de três a cinco vezes por semana – em 2018 o percentual foi 2% menor – e a maioria (61%) se disse disposta a reduzir a própria remuneração em troca de mais tempo livre ou da possibilidade de equilibrar melhor a vida pessoal e o trabalho.
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Vida na rede
Os participantes da pesquisa informaram que passam quase três horas e meia por dia na internet semana fazendo uso pessoal e profissional da rede mundial de computadores. Apesar de passar um pouco mais de tempo na internet por lazer do que por motivos profissionais, a maioria (54%) não vê impacto das mídias sociais na interação com os pacientes. Tanto entre os 7% que classificaram o impacto como negativo, como entre os 39% que o consideraram positivo, o aplicativo WhatsApp foi amplamente citado, ora como uma solução...
"Procuro sempre desmistificar assuntos polêmicos que surgem nas mídias sociais, colaborando para que meus pacientes tenham uma postura mais crítica sobre os assuntos mais comentados do momento. Também faço muitas orientações por aplicativos de mensagens instantâneas, evitando que meus pacientes compareçam desnecessariamente a prontos atendimentos", opinou um pediatra.
...ora como um problema:
"As mídias sociais tiram a privacidade do médico, e muitos pacientes usam o WhatsApp para não precisar pagar por uma consulta", reclamou um dermatologista.
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Crenças
Na amostra deste ano, a porcentagem de médicos que respondeu ter uma religião ou crença espiritual aumentou de 70% em 2018 para 77%. Também foram maioria (88%) os que acreditam que a religião/espiritualidade os ajuda a lidar com os desafios da profissão.
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Perfil
A amostra de 2020 segue dentro do mesmo perfil já mostrado em 2018: bem dividida entre homens e mulheres, de maioria branca e casada ou vivendo com parceiro(a) – sendo a maioria dos cônjuges também médico ou outro profissional da área da saúde.
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Atuação
Além das informações mostradas acima, os resultados mostraram que metade dos participantes declarou atuar apenas no sistema privado; os outros 50% se dividiram entre o serviço público (34%) ou ambos (16%). Os estados com maior representatividade na amostra foram São Paulo (34%), Rio de Janeiro (11%), Rio Grande do Sul (11%) e Minas Gerais (9%).
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